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O NOVO HOMEM

(Jornal "O GLOBO" 11/08/2002)

A segunda metade da década de 60 foi marcada pelo início da liberação feminina, principalmente com o advento das pílulas anticoncepcionais, quando a mulher passou a enfrentar o sexo de igual para igual. Com isso, os tabus foram gradativamente se reduzindo. A famosa paquera, outrora masculina, passou a ser recíproca. As portas foram abertas para o mercado de trabalho feminino. No aspecto científico e cultural, as faculdades começaram a sentir uma participação maior da mulher, chegando ao ponto de, no momento, nos cursos de direito, jornalismo e arquitetura, presenciarmos uma maioria participativa da mulher.

A jovem de hoje, em sua fase casadoira, é totalmente distinta daquela que conhecíamos há 20 ou 30 anos. Todas têm curso superior completo, enfrentam de igual para igual a disputa por empregos, a ponto tal de no Poder Judiciário, vermos nas carreiras do Ministério Público e da Defensoria Pública, a predominância feminina chegando a 60% do número de profissionais nessa área, comparativamente com a participação masculina.

Hoje, temos inúmeras juízas, desembargadoras, ministras de cortes superiores, inclusive no Supremo Tribunal Federal (STF). Não só no Brasil, como no exterior, inclusive no México, na Venezuela e nos Estados Unidos. O mesmo ocorre com o jornalismo e a arquitetura, onde deparamos com a maior participação numérica da mulher. Tais alterações de modus vivendi vêm trazendo uma modificação na estrutura econômica e financeira dos lares, onde muitas vezes a participação financeira feminina é bem superior à do homem. Passamos a ver as senhoras executivas de grandes empresas nacionais e multinacionais. A mulher dispensando a integralidade dos dias de repouso pós-parto. Desde a década de 70, é também crescente e de forma vertiginosa o número de creches.

O que antigamente era lugar para o cuidado e atenção de crianças pobres e de classe média baixa, enquanto seus pais trabalhavam em empregos simples durante o dia, vemos hoje luxuosíssimas creches com instalações e sofisticações de Primeiro Mundo. Com as dificuldades de babás perfeitas, o que mais tempo fica no lar, passa a tomar conta da casa e dos filhos.

E, justamente, este fenômeno surge de novo, quando os homens, com empregos de meio-expediente, têm mais tempo para a dedicação à família que as mulheres que assumiram os costumes de antanho de um núcleo patriarcal. As mulheres passaram a se envolver nos múltiplos negócios das atividades do mundo capitalista e são inclusive mais cobiçadas para tais funções pelos respectivos dirigentes.

O número de homens que nos últimos anos passam mais tempo dentro do lar com os filhos tem se multiplicado de forma assustadora, transformando-se e assumindo condições de verdadeiros donos-de-casa, justificando inclusive, para a proteção do interesse dos filhos menores, que tenham a guarda de seus filhos em caso de separação, já que estão mais com os menores no dia-a-dia que as suas mães. Tenho visto uma gradativa alteração em nossos costumes de tradições ibéricas e na formação dos núcleos familiares machistas, patriarcais e dos clãs. A legislação, a doutrina e a jurisprudência cada dia que passa mais protegem as volições das crianças, até mesmo antes dos 12 anos estabelecidos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. Jovens de 6 a 10 anos já são direta e pessoalmente ouvidos por magistrados, curadores de família, assistentes sociais, por cientistas da área e psicólogos, estes para o auxílio necessário e direto ao Poder Judiciário.

Estão nesses casos os pais que levam e buscam diariamente seus filhos no colégio, freqüentam os pediatras e odontólogos, compram roupas, passeiam e se divertem num contato permanente e diário, quando a maior atividade no exterior do lar é desenvolvida pela mulher. Em suma, como vimos na edição especial do “Jornal da Família” há 15 dias, estamos vivenciando uma nova era na família como instituição, com uma forma participativa mais igual ou já preponderante da figura paterna, que se habilita cada vez mais na disputa de igual para igual na guarda e educação de seus filhos.

PAULO LINS E SILVA* é advogado de família

Jornal: O GLOBO Caderno: Jornal da Família (11/08/2002)

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