O PODER JUDICIÁRIO NORTE-AMERICANO
É marcante a consciência dos juízes norte-americanos de que, caso todas as ações propostas fossem a julgamento, o sistema estaria falido. Dessa maneira, apenas 10% das demandas são apreciadas por um juiz. O restante fica por conta dos precedentes judiciais e ainda do ADR - conhecida forma alternativa de solução de litígios que consiste num procedimento prévio de conciliação a cargo de servidores do tribunal, bacharéis em direito e especialistas.
O precedente judicial é encarado com naturalidade pelos juízes. Alegam que, se estão vinculados a lei, ato normativo oriundo do legislativo, por que não se vincular a um ato normativo oriundo do próprio Judiciário? Constituem, assim, os precedentes grande parte do conjunto de normas jurídicas aplicadas nas cortes. São eles respeitados tanto pelo Judiciário quanto pelo Executivo, proporcionando certa estabilidade nas relações sociais.
Quanto ao ADR, permito-me tecer algumas consideracões. O juiz ao receber uma petição inicial, em audiência explica às partes as vantagens do programa (não haver perdedor, sem custas, redução do tempo gasto e outras) e decide, com as partes e advogados, se o ADR é aplicável, ou qual programa mais indicado e quando a sessão inicial será marcada.
A mediação é formulada por um terceiro neutro (mediador) que auxilia as partes, em audiências, explorando as possíveis soluções. Dependendo da complexidade do caso, serão necessárias mais sessões, o que demandará um tempo maior. O mediador não emite juízo de valor, mas incentiva as partes a avaliarem seus interesses levando em consideração as possíveis soluções. Em algumas jurisdições, o mediador precisa de ser bacharel em direito e ter efetuado um programa de treinamento. Atualmente, existe o programa de mediação em causas de família, em causa cíveis (como mediação civil), em processos relativos a direito tributário (o mediador tem de possuir experiência no campo tributário).
O processo de mediação é confidencial e inicia-se com audiência do mediador e as partes para delimitar melhor os pontos controvertidos, o mediador explica o processo e concede a cada parte a oportunidade de expor sua opinião sobre o litígio, como se fosse uma discussão inicial entre as partes e o mediador sobre o caso. No final dessa audiência, o mediador se reúne individualmente com cada parte, aconselhando-lhes a analisarem suas posições, propondo sugestões, incentivando-os a apresentarem propostas. Posteriormente,podem ser necessárias novas audiências, dependendo da complexidade do caso, e o procedimento de mediação terminará com um acordo ou quando expirar o prazo fixado pelo juiz. Depois da primeira audiência, as partes apresentarão ao mediador, em sete dias, petição com no máximo dez páginas, delimitando os fatos e fundamentos da causa. Se houver acordo, as partes assinarão um termo escrito, com estipulação de uma pena para o não cumprimento. Se não for possível o acordo, o mediador fará a comunicação imediata à Justiça, para que o caso continue no processo litigioso. É importante salientar que nos EUA não há distinção, ao se fazer um acordo, se uma das partes for entidade pública.
A seleção dos juízes norte-americanos consiste num processo político no qual inexiste concurso público. O juiz é indicado pelo Presidente da República (ou Governador, se juiz estadual), dentre cidadãos não necessariamente bacharéis em direito, o Departamento de justiça verifica a qualificação e investiga a vida pregressa do candidato e, posteriormente, o nome é levado ao Congresso para aprovação. Tal critério de investidura é tradição secular no Direito norte-americano. Apenas em alguns estados que a investidura decorre de eleição popular. Acreditam eles que, embora a investidura seja política, a jurisdição não o é, já que ao juiz é garantida a independência calcada nas seguintes regras:
1. separação dos poderes;
2. igualdade entre poderes;
3. separação do poder judiciário do Ministério da Justiça;
4. vitaliciedade dos juízes;
5. remuneração adequada;
6. irredutibilidade de vencimentos;
7. pessoal de apoio adequado;
8. inamovibilidade;
9. poder de revisão, através dos recursos (ou seja, os recursos contra as sentenças devem ser analisados pelo próprio judiciário);
10. correção dos erros pelo próprio poder judiciário, sem interferência dos demais;
11. submissão ao Código de Ética (formulado pelo próprio poder judiciário);
12. administração dos órgãos judiciais pelo próprio judiciário;
13. controle das atividades pelos tribunais (através da conferência judicial);
14. controle dos processos nos tribunais pelos próprios juízes;
15. controle das atividades diárias pelos juízes;
16. controle sobre a educação judicial;
17. controle do espaço e instalações do judiciário pelos juízes;
18. formação dos profissionais que desempenharão as funções de gerência dos tribunais.
Nos EUA um governante é conhecido pelos juízes que indica, de modo a tornar criteriosa a escolha. É bem expressiva a participação da imprensa na avaliação dos juízes, o que leva à idéia de participação popular, como forma de controle. Além disso, sustentam que a investidura política pode aferir a maturidade e o caráter do candidato, o que não se obtém de forma satisfatória com a realização de concurso público. Lembre-se ainda que a opinião pública deposita grande percentual de credibilidade no Judiciário.
Um juiz federal norte-americano percebe em média a importância de 132 mil dólares por ano (primeiro grau), 140 mil (segundo grau) e 160 mil (Suprema Corte). Os federais possuem uma verba aproximada de quarenta mil dólares anuais para destinar ao seu gabinete, distribuindo-a entre os seus subordinados, da forma que melhor lhe convier. Não há utilização de carros oficiais ou outra vantagem qualquer. Não ouvimos críticas dos magistrados sobre a remuneração.
Não há aposentadoria compulsória. Partem da premissa de que quanto mais experiente o juiz melhor a jurisdição. Em alguns casos, se do desejo do juiz, poderá haver redução da carga de trabalho, e no caso da aposentadoria dos juízes vitalícios é mantida em favor deles um escritório com secretária para eventuais trabalhos acadêmicos.
A assessoria dos juízes é bem difundida. É comum recém-formados ingressarem nos tribunais como assessores de juízes. Aliás, todo bom currículo contém uma passagem por um tribunal, já que posteriormente são os assessores disputados pelos melhores escritórios de advocacia. É uma espécie de estágio, por prazo determinado, sendo os assessores recrutados nas melhores universidades. Dessa maneira, tem-se mão de obra capacitada, estimulada e sem vínculo. A eles cabe relatar processos e ainda as decisões de menor importância, devendo o juiz adotar critérios de modo a evitar a delegação da jurisdição.
Os juízes norte-americanos, estaduais e federais, estão sujeitos a um código de ética, que contém sete princípios básicos:
1- O juiz deve abraçar a integridade e independência do judiciário. - A independência judicial está vinculada a sua credibilidade pública, de modo que o juiz deve manter a independência não só internamente, mas demonstrar para o público que age como tal. O juiz deve manter-se como um símbolo e daí o controle da sua vida privada;
2- o juiz deve evitar improbidade e a aparência de improbidade em todas as atividades. - atividades e contatos políticos; exploração da função judicial (tráfico de influência); comportamento pessoal e correlatos; desqualificação. É inapropriado que um juiz seja membro de uma associação que faça discriminação de negros, mulher, sexo, religião, raça.
3- o juiz deve exercer suas funções imparcial e diligentemente. - veda-se o nepotismo e favoritismo; as obrigações judiciais têm prioridade. O juiz não deve aconselhar-se com amigos ou técnicos, permitindo-se a consulta apenas entre colegas;
4- o juiz deve engajar-se em atividades extrajudiciais para aperfeiçoar o direito, o sistema legal e a administração da justiça. - falar, palestrar, ensinar; órgãos de deliberação executiva ou legislativa; organizações para melhorar o direito; uso das fontes judiciais. A remuneração para tais atividades não pode superar determinado limite imposto por lei. Qualquer atividade que não importar em melhoria para a imagem do judiciário deve ser evitada;
5- o juiz deve regular atividades extrajudiciais de modo a minimizar o risco de conflito com suas atividades judiciais. Devem ser evitadas condutas que possam o levar aos tribunais. É proibido o exercício de qualquer outra atividade jurídica (advocacia, consultoria etc.); atividades ilegais permitidas, artes, esportes; atividades cívicas, assistenciais e educacionais; proibição do recebimento de fundos e presentes;
6- o juiz deve regularmente arquivar os comprovantes de renda recebidos pela função judicial e atividades extrajudiciais. - limites da compensação (das vantagens); reembolso de despesas; relatórios anuais. É proibido o recebimento de honorários de atividades que tenha exercido antes da sua nomeação;
7- o juiz deve manter-se afastado de atividades políticas. - sem exceções.
Há ainda causas de impedimentos e suspeição que podem ser levantadas por qualquer pessoa e que recebem a denominação de causa de desqualificação. A particularidade é que se mantém em sigilo o nome de quem apresenta a desqualificação. O juiz pode sofrer o impeachemant (afastamento da atividade judiciante), sem prejuízo da condenação penal, se for o caso.
O juiz não pode receber, a qualquer título, renda mensal que supere determinado limite. As dúvidas são esclarecidas mediante consulta por escrito junto a um órgão específico.
* Relatório do Estágio para Juízes Federais, junto ao Federal Judicial Center/Washington-DC, em outubro de 1995, promovido pela AJUFF e CEJ/CJF, para o qual colaboraram os Juízes Dra. Eliana Calmon (TRF-1a), Dr. Leão (SJ/DF) e Dr. Cândido Leal (SJ/RS).
* Juiz Federal/RJ
O precedente judicial é encarado com naturalidade pelos juízes. Alegam que, se estão vinculados a lei, ato normativo oriundo do legislativo, por que não se vincular a um ato normativo oriundo do próprio Judiciário? Constituem, assim, os precedentes grande parte do conjunto de normas jurídicas aplicadas nas cortes. São eles respeitados tanto pelo Judiciário quanto pelo Executivo, proporcionando certa estabilidade nas relações sociais.
Quanto ao ADR, permito-me tecer algumas consideracões. O juiz ao receber uma petição inicial, em audiência explica às partes as vantagens do programa (não haver perdedor, sem custas, redução do tempo gasto e outras) e decide, com as partes e advogados, se o ADR é aplicável, ou qual programa mais indicado e quando a sessão inicial será marcada.
A mediação é formulada por um terceiro neutro (mediador) que auxilia as partes, em audiências, explorando as possíveis soluções. Dependendo da complexidade do caso, serão necessárias mais sessões, o que demandará um tempo maior. O mediador não emite juízo de valor, mas incentiva as partes a avaliarem seus interesses levando em consideração as possíveis soluções. Em algumas jurisdições, o mediador precisa de ser bacharel em direito e ter efetuado um programa de treinamento. Atualmente, existe o programa de mediação em causas de família, em causa cíveis (como mediação civil), em processos relativos a direito tributário (o mediador tem de possuir experiência no campo tributário).
O processo de mediação é confidencial e inicia-se com audiência do mediador e as partes para delimitar melhor os pontos controvertidos, o mediador explica o processo e concede a cada parte a oportunidade de expor sua opinião sobre o litígio, como se fosse uma discussão inicial entre as partes e o mediador sobre o caso. No final dessa audiência, o mediador se reúne individualmente com cada parte, aconselhando-lhes a analisarem suas posições, propondo sugestões, incentivando-os a apresentarem propostas. Posteriormente,podem ser necessárias novas audiências, dependendo da complexidade do caso, e o procedimento de mediação terminará com um acordo ou quando expirar o prazo fixado pelo juiz. Depois da primeira audiência, as partes apresentarão ao mediador, em sete dias, petição com no máximo dez páginas, delimitando os fatos e fundamentos da causa. Se houver acordo, as partes assinarão um termo escrito, com estipulação de uma pena para o não cumprimento. Se não for possível o acordo, o mediador fará a comunicação imediata à Justiça, para que o caso continue no processo litigioso. É importante salientar que nos EUA não há distinção, ao se fazer um acordo, se uma das partes for entidade pública.
A seleção dos juízes norte-americanos consiste num processo político no qual inexiste concurso público. O juiz é indicado pelo Presidente da República (ou Governador, se juiz estadual), dentre cidadãos não necessariamente bacharéis em direito, o Departamento de justiça verifica a qualificação e investiga a vida pregressa do candidato e, posteriormente, o nome é levado ao Congresso para aprovação. Tal critério de investidura é tradição secular no Direito norte-americano. Apenas em alguns estados que a investidura decorre de eleição popular. Acreditam eles que, embora a investidura seja política, a jurisdição não o é, já que ao juiz é garantida a independência calcada nas seguintes regras:
1. separação dos poderes;
2. igualdade entre poderes;
3. separação do poder judiciário do Ministério da Justiça;
4. vitaliciedade dos juízes;
5. remuneração adequada;
6. irredutibilidade de vencimentos;
7. pessoal de apoio adequado;
8. inamovibilidade;
9. poder de revisão, através dos recursos (ou seja, os recursos contra as sentenças devem ser analisados pelo próprio judiciário);
10. correção dos erros pelo próprio poder judiciário, sem interferência dos demais;
11. submissão ao Código de Ética (formulado pelo próprio poder judiciário);
12. administração dos órgãos judiciais pelo próprio judiciário;
13. controle das atividades pelos tribunais (através da conferência judicial);
14. controle dos processos nos tribunais pelos próprios juízes;
15. controle das atividades diárias pelos juízes;
16. controle sobre a educação judicial;
17. controle do espaço e instalações do judiciário pelos juízes;
18. formação dos profissionais que desempenharão as funções de gerência dos tribunais.
Nos EUA um governante é conhecido pelos juízes que indica, de modo a tornar criteriosa a escolha. É bem expressiva a participação da imprensa na avaliação dos juízes, o que leva à idéia de participação popular, como forma de controle. Além disso, sustentam que a investidura política pode aferir a maturidade e o caráter do candidato, o que não se obtém de forma satisfatória com a realização de concurso público. Lembre-se ainda que a opinião pública deposita grande percentual de credibilidade no Judiciário.
Um juiz federal norte-americano percebe em média a importância de 132 mil dólares por ano (primeiro grau), 140 mil (segundo grau) e 160 mil (Suprema Corte). Os federais possuem uma verba aproximada de quarenta mil dólares anuais para destinar ao seu gabinete, distribuindo-a entre os seus subordinados, da forma que melhor lhe convier. Não há utilização de carros oficiais ou outra vantagem qualquer. Não ouvimos críticas dos magistrados sobre a remuneração.
Não há aposentadoria compulsória. Partem da premissa de que quanto mais experiente o juiz melhor a jurisdição. Em alguns casos, se do desejo do juiz, poderá haver redução da carga de trabalho, e no caso da aposentadoria dos juízes vitalícios é mantida em favor deles um escritório com secretária para eventuais trabalhos acadêmicos.
A assessoria dos juízes é bem difundida. É comum recém-formados ingressarem nos tribunais como assessores de juízes. Aliás, todo bom currículo contém uma passagem por um tribunal, já que posteriormente são os assessores disputados pelos melhores escritórios de advocacia. É uma espécie de estágio, por prazo determinado, sendo os assessores recrutados nas melhores universidades. Dessa maneira, tem-se mão de obra capacitada, estimulada e sem vínculo. A eles cabe relatar processos e ainda as decisões de menor importância, devendo o juiz adotar critérios de modo a evitar a delegação da jurisdição.
Os juízes norte-americanos, estaduais e federais, estão sujeitos a um código de ética, que contém sete princípios básicos:
1- O juiz deve abraçar a integridade e independência do judiciário. - A independência judicial está vinculada a sua credibilidade pública, de modo que o juiz deve manter a independência não só internamente, mas demonstrar para o público que age como tal. O juiz deve manter-se como um símbolo e daí o controle da sua vida privada;
2- o juiz deve evitar improbidade e a aparência de improbidade em todas as atividades. - atividades e contatos políticos; exploração da função judicial (tráfico de influência); comportamento pessoal e correlatos; desqualificação. É inapropriado que um juiz seja membro de uma associação que faça discriminação de negros, mulher, sexo, religião, raça.
3- o juiz deve exercer suas funções imparcial e diligentemente. - veda-se o nepotismo e favoritismo; as obrigações judiciais têm prioridade. O juiz não deve aconselhar-se com amigos ou técnicos, permitindo-se a consulta apenas entre colegas;
4- o juiz deve engajar-se em atividades extrajudiciais para aperfeiçoar o direito, o sistema legal e a administração da justiça. - falar, palestrar, ensinar; órgãos de deliberação executiva ou legislativa; organizações para melhorar o direito; uso das fontes judiciais. A remuneração para tais atividades não pode superar determinado limite imposto por lei. Qualquer atividade que não importar em melhoria para a imagem do judiciário deve ser evitada;
5- o juiz deve regular atividades extrajudiciais de modo a minimizar o risco de conflito com suas atividades judiciais. Devem ser evitadas condutas que possam o levar aos tribunais. É proibido o exercício de qualquer outra atividade jurídica (advocacia, consultoria etc.); atividades ilegais permitidas, artes, esportes; atividades cívicas, assistenciais e educacionais; proibição do recebimento de fundos e presentes;
6- o juiz deve regularmente arquivar os comprovantes de renda recebidos pela função judicial e atividades extrajudiciais. - limites da compensação (das vantagens); reembolso de despesas; relatórios anuais. É proibido o recebimento de honorários de atividades que tenha exercido antes da sua nomeação;
7- o juiz deve manter-se afastado de atividades políticas. - sem exceções.
Há ainda causas de impedimentos e suspeição que podem ser levantadas por qualquer pessoa e que recebem a denominação de causa de desqualificação. A particularidade é que se mantém em sigilo o nome de quem apresenta a desqualificação. O juiz pode sofrer o impeachemant (afastamento da atividade judiciante), sem prejuízo da condenação penal, se for o caso.
O juiz não pode receber, a qualquer título, renda mensal que supere determinado limite. As dúvidas são esclarecidas mediante consulta por escrito junto a um órgão específico.
* Relatório do Estágio para Juízes Federais, junto ao Federal Judicial Center/Washington-DC, em outubro de 1995, promovido pela AJUFF e CEJ/CJF, para o qual colaboraram os Juízes Dra. Eliana Calmon (TRF-1a), Dr. Leão (SJ/DF) e Dr. Cândido Leal (SJ/RS).
* Juiz Federal/RJ