Análises

RECURSOS TERAPEUTICOS NO PROCESSO DE MEDIAÇÃO

Na minha vivência com alunos e profissionais que se interessam por mediação, tenho percebido o quanto se torna difícil exemplificar casos reais, sem com isso nos apegarmos em conceitos adquiridos em nossa experiência profissional.

Apesar de não termos em nossos consultórios um freqüente atendimento utilizando a mediação, percebo que a cada atendimento que faço, procuro melhorar meu trabalho e dar respostas a uma serie de problemas que a prática me apresenta.

Um desses problemas é o de entender, na sua real dimensão, quais são os conflitos propostos pelas partes e encontrar os que realmente são importantes para eles, desvencilhada dos procedimentos terapêuticos utilizados nos meus aconselhamentos, encontrando assim uma forma de construir acordos que satisfaçam as reais necessidades das partes e evitem o ressurgimento, ou o que é pior, o agravamento dos conflitos familiares.

Contudo, o que mais tem chamado minha atenção, é o impacto que os possíveis acordos geram nas pessoas, muito mais que a solução para seus conflitos. Este impacto pessoal é transcendental para a aceitação de acordos e talvez esta visão possa nos ajudar em algum momento dos nossos trabalhos.

Um mediador parte do principio de que as pessoas percebem o mundo através de diferentes modos, os quais influenciam na forma em que cada pessoa se coloca diante de um conflito.

Este principio básico nos permite trabalhar com indivíduos de diferentes visões do mundo, principalmente quando estão em busca da autentica realidade, ou seja, a verdade, onde uma parte poderia estar equivocada e outra não.

No entanto, numa mediação as partes procuram evitar uma experiência negativa e avançar na busca de uma experiência positiva. Nosso trabalho é assistir a ambas as partes para encontrarem uma solução aceita conjuntamente desde suas visões do mundo e suas necessidades basicamente diferentes, até alcançar um resultado positivo para ambos.

Vejamos um caso por mim atendido ( nomes fictícios ) , onde “ a dignidade está acima de tudo ”.

Maria, de 33 anos de idade, estava casada com Jose de 35 anos de idade.

Dessa união nasceu um filho, hoje com 6 anos.

Estiveram em meu consultório, buscando a mediação, para solucionar um problema em relação à pensão alimentícia do menor.

Nesse momento, eles estavam separados consensualmente, há um ano.

José estava desempregado, sendo impossível continuar pagando a pensão.

Nossos encontros foram bastante tranqüilos, a relação entre eles era boa e nunca tiveram problemas com relação a visitas ao menor, apesar dele não cumprir com sua obrigação de pagar a pensão alimentícia.

Na segunda sessão, Maria pede para que José faça um esforço para aumentar a pensão, sustentando que mesmo sendo boa à relação entre eles, ela não gostaria de ficar de braços cruzados vendo seu filho não ter um bem estar melhor ao desejado.

Na terceira sessão, José, traz uma proposta a qual era superior àquela referendada por ocasião da separação. Maria, inicialmente, aceitou a proposta, mas fica indignada e duvidosa de como ele iria pagar essa quantia se o mesmo, encontrava-se ainda desempregado.

José respondeu que sua mãe pagaria a pensão alimentícia durante os dois primeiros meses, e depois ele se responsabilizaria pela mesma. Nesse momento, Maria diz: “ não estou de acordo, a pensão deve ser paga por ele ”.

Trabalhamos terapeuticamente, e em uma sessão privada com Maria descobrimos que: José era filho único e havia se casado com Maria há 9 anos ( ela tinha 24 e ele 26 anos de idade ). Maria em seus relatos sustentava que sua relação conjugal se fazia insustentável devido às inferências que a mãe de José fazia em suas vidas, tornando insuportável o relacionamento, já que ela ( mãe ) considerava Maria “ um ser inferior a seu filho ”.

“ Não estou disposta a expor-me aos demais como mantida por essa senhora, tenho minha dignidade, e talvez essa foi à única coisa que essa senhora não me tirou, mesmo que tenha que morrer de fome com meu filho, não aceitarei esse dinheiro. Ser digna frente ao meu filho é o que realmente me importa, não quero ter de abaixar minha cabeça diante dele ”.



Esse é um dos casos atendido, onde situações como essa, acordados entre as partes, acabam não prosperando em sua aplicação. Pergunto-me: Por que algumas pessoas se mostram tão resistentes diante de propostas criadas por eles e de certa forma vantajosas?

No meu entender, a resposta não está somente do lado relacional, ou seja, como é que as partes se visualizam entre si e qual é o estado da dita relação, senão também com o impacto que os acordos podem gerar em diversos âmbitos muito importantes para essas pessoas. Acreditam que mais importante que a solução do problema, é perceber que existem situações que condicionam o acordo ou não, situações que não são apenas a satisfação da necessidade manifesta formalmente.

Nesse caso onde – “ minha dignidade é que importa ” – vemos que Maria, apesar de ter a possibilidade de aceitar a proposta vantajosa, preferiu não fazê-lo, procurando manter a sua imagem digna diante de sua família e na imagem que seu filho teria dela.

Maria deixou de se preocupar com o acordo ( problema que os levaram a mediação ) e tem centrado sua atenção no impacto que este traria.

Esse desfecho, me dá maior clareza que, diante de situações como essa, devo buscar e aplicar técnicas e procedimentos apropriados.

Situações que pertencem à esfera dos aspectos pessoais dos mediados são muito importantes e tem que levar em conta aspectos até então desconhecidos para obtermos êxito em nossos procedimentos de mediação.

Psic. Julieta Arsênio – CRP. 08/0271
Mediadora

Written by Psic. Julieta Arsênio - Mediadora.

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