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Ser Pai

SE ALGUÉM VENDESSE MÃE, NINGUÉM COMPRAVA PAI.

Imagine que você foi às compras num supermercado e se deparou com um produto chamado Mãe. Logo adiante, na gôndola vizinha, você avistou um produto chamado Pai. Qual dos dois você acha que venderia mais? Qual dos dois custaria mais caro? Qual dos dois lhe passaria a sensação de ter mais qualidade? Sem medo de errar, posso garantir que o produto Mãe se esgotaria muito antes do que o produto Pai e que as margens de lucro do fabricante do primeiro ainda seriam bem maiores. Em publicidade, a forma como o público enxerga uma marca ou um produto é determinante para o seu sucesso no mercado. Ou seja, percepção é tudo. Podemos afirmar, portanto, que a figura paterna precisa na verdade é de uma boa consultoria em gestão de imagem.

Um bom consultor tentaria primeiro entender o problema. Por que os pais vivem numa crise de identidade e não tem o mesmo valor de marca que as mães tem? Ora, podemos listar diversas razões. A primeira é natural: são as mães que geram os bebês em suas barrigas. Isso cria um vínculo emocional e afetivo direto com os filhos. São as mães que amamentam, fornecem o primeiro alimento e garantem a sobrevivência do bebê. Quanto a isso, não há nada que possamos fazer. A natureza teve que escolher um dos lados e ponto.

Vamos à parte do problema que nos cabe. Somos culpados por boa parcela da imagem pouco positiva que temos por não sabermos nos posicionar nesse mercado. Delegamos todas as tarefas de casa para as mães, desde as mais banais. Concentramos nossa atenção no trabalho e em conquistas financeiras. Então, desde que nossos filhos nascem, mostramos a eles que a mamãe é quem cuida e dá carinho e o papai é quem não tem tempo para as crianças porque já tem responsabilidades demais. E aos poucos vamos perdendo participação no cerne emocional da família, ou como gostam os consultores, perdemos Market Share.

Vamos mais longe. Nas separações, raramente os homens brigam pela guarda de seus filhos. Pelo contrário, a maioria refuta a idéia no primeiro pensamento como se isso fosse um grande sacrifício. Cria-se então uma cultura de que as mães naturalmente são as mais indicadas para deter a guarda dos filhos. Não podia ser diferente, afinal elas estão sempre dispostas a tudo para manter seus filhos por perto como uma empresa enxuta, inovadora que briga pela liderança, faz promoções para fidelizar sua clientela e investe pesado em propaganda. Enquanto isso nós agimos como uma velha empresa que atende mal seus clientes e, pesada demais, não tem motivação para novas conquistas. Somos a TransBrasil, elas são a Gol.

Mãe vem até com slogan, aliás, mais de um: “Mãe só tem uma!” (como se houvesse mais de um pai por criança), “Em coração de mãe cabe todo mundo”, “Mãe é mãe” e por aí vai.

Para piorar nossa situação, a religião também ajuda a confirmar a supremacia feminina em questões familiares. A figura da Virgem Maria, a mãe do próprio Deus, transfere às mulheres sua aura intocável, pura e imaculada. Como contraponto, casado com Maria, está o carpinteiro José. Um trabalhador, de fato, mas que não tem nem de perto o apelo emocional e espiritual da Virgem Santíssima. Se fosse uma eleição, a Virgem levava no primeiro turno.

O resultado é que temos de um lado a figura institucional da mulher: mãe, frágil, doce, carinhosa, detentora do instinto feminino, o instinto de proteção de sua prole. Do outro lado temos a figura institucional do homem: rude, muitas vezes violento, aquele que coloca o trabalho a frente da própria família. A imagem materna é imbatível. Chega a ser covardia. É como querer lançar uma empresa para competir com a Nestlé. É difícil, muito difícil. Quer uma prova? Basta comparar o volume de vendas no Dia das Mães com o do Dia dos Pais. O Dia das Mães é a segunda data mais importante do ano para o varejo, perdendo apenas para o Natal. O Dia dos Pais, do jeito que anda, vai acabar perdendo até para o Dia da Secretária.

Na maioria das famílias, essa diferença de percepção é vista quase como um folclore, parte cultural da nossa sociedade. Muitas vezes, é interpretada como uma divisão saudável do que é o papel do homem e da mulher na família. Mas daí, surge a gravidade da constatação de que nem toda mãe é santa. Existe muita mulher que se aproveita da condição maternal e da percepção em torno dela construída para se auto-beneficiar. E, aquilo que era folclórico pode se tornar um preconceito cruel, principalmente nas varas de família contra os homens. Nós, pais de verdade, somos muitas vezes alijados da convivência com nossos filhos pelo simples fato de que a mulher é percebida como a parte mais adequada para guiar os filhos. E vai para o espaço todo o sentido de igualdade perante a Justiça. As leis são iguais para todos, mas as decisões dos juízes nunca são. E os juízes lavam suas mãos pois estão protegidos pela percepção quase universal de que estão agindo como manda a natureza.

Não nos cabe aqui tentar desconstruir a percepção maternal mas sim, de alguma forma, tentar competir com isso. Precisamos melhorar a imagem institucional paterna o quanto antes. Se conseguirmos construir a imagem de que os pais também são carinhosos, também tem instinto de proteção, também amam e cuidam de seus filhos, podemos criar o ambiente propício para negociações mais favoráveis para o nosso lado na Justiça.

Nessa hora, o consultor começaria a pensar no “Como?”. Como mudar a percepção paterna? Bom, eu tenho várias sugestões. Mas isso já é assunto para o próximo artigo.




RODRIGO GANEM
é publicitário trabalha com Marketing Institucional e Político
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