Análises

EM BUSCA DE UMA VIDA MAIS CHEIA DE VIDA (DEFESA EM JUIZO)

Argumentação em defesa da convivência de pai com os filhos Em função da solicitação feita pela senhora, referente à organização dos argumentos que sustentariam a tese do processo, no qual estaríamos movendo em favor da regulamentação de visitas, estive imaginando qual deveria ser a linha de raciocínio que melhor retratasse não só os meus sentimentos, como também os fatos que vem ocorrendo.

É de uma reação quase que instintiva, procurar concentrarmos esforços em cima de argumentos que maximizem ilustrar o quanto a mãe de meu filho vem apresentando um “comportamento inadequado” e que, por conseguinte, tem prejudicado o exercício de minha paternidade.

Diante de um momento reflexivo, percebi que muito mais valioso que apontar erros ou defeitos, o que intuitivamente conduziria ao equívoco de pré-julgamentos, é mostrar tudo aquilo que se soma de forma negativa à formação de meu filho, como também todas as oportunidades que se deixam de consolidar em vista à construção de afeto, carinho e, acima de tudo, amor entre nós dois.

Iniciemos, portanto, a contextualização do propósito, através da questão invocada pela seguinte pergunta: qual a importância dada a um pai na vida de seu filho?

É fato que para cada pessoa questionada existam abordagens e opiniões divergentes, visto a complexidade pelo qual o tema se encerra, mas acredito também que exista pelo menos um ponto em comum dentro de cada resposta e que está relacionado às condições do pai em oferecer um ambiente de amor, analisado sob a perspectiva dos sentimentos da criança. Ou seja, ao meu ver, a questão deve ser compreendida aqui, não pelo quanto sou capaz de oferecer um clima de amor ao meu filho, através de gestos, superproteção, presentes materiais, tempos dedicados, que por muito podem ser confundidas como provas de amor, mas o quanto meu filho é capaz de se sentir amado por meio das ações e sentimentos que o transmito.

Identificada a essência de meu raciocínio, é fundamental analisarmos a maneira ou até mesmo os ingredientes necessários para se alcançar esse clima de amor de forma realmente efetiva.

Um dos valores que considero imprescindível e substancial à formação do clima de amor está relacionado com a concepção e o significado da palavra presença. O que é estar realmente presente em um encontro com seu filho e poder transformar esse momento em algo autêntico e verdadeiro?

A criança precisa que seus pais estejam com suas atenções concentradas e focalizadas em direção aos seus atos e aos seus sentimentos manifestados, estando sensíveis para perceber todas as emoções que traduzem as particularides de seu filho. E isso só ocorre quando os pais vivem esses momentos entregues por inteiro, pois em nada adianta estar presente fisicamente sendo que a mente esteja presa em outro lugar, o que acaba implicando uma proximidade não-verdadeira.

É exatamente neste ponto que mais tenho dificuldade em exercer minha paternidade, sintonizado com as idéias que acredito.

Ocorre que desde o momento em que comecei a participar da vida de meu filho, a minha condição de pai foi colocada a um plano que indiscutivelmente apresenta um valor “inferior” ao da mãe e seus familiares. Segue que, tudo o que possa ser oferecido a mim para que eu goze o prazer de ser pai, concerne à concepção de valor paternal de acordo com a conveniência circunstancial ou emocional, ao qual se encontra a mãe de meu filho. E para mim, pior do que não ter valor é ter um valor materializado pela conveniência. Conseqüentemente, é desta forma que a concepção de valor, a mim atribuído, define o quanto ou a sob quais condições devo estar presente diante de meu filho. Subitamente me pergunto se vou conseguir ou não estar amanhã com meu filho em minha casa, junto de meus familiares. Ao encontro de uma resposta, firma-se um estado de constante incerteza e que o desfecho acaba não dependendo do mundo já construído entre eu e meu filho.

Infelizmente, as nossas diferenças e alguns problemas do passado mal resolvidos nos impedem de mantermos um relacionamento amigável, e que permita buscar um entendimento capaz de resolver conjuntamente as dificuldades que o nosso filho possa encontrar durante o seu crescimento. Mas é aí que se manifesta um dos principais problemas. Se caso minhas idéias não estejam de acordo com as suas e isso conduza a um não-entendimento conflitante, estou sempre sob a ameaça de sofrer conseqüências que afetam diretamente o relacionamento entre meu filho e eu.

E é isso tudo que refuto, uma vez que o exercício da paternidade não é um direito concedido pela mãe.

Em conformidade com essa linha de pensamento, tal realidade me leva a questionar o significado da palavra “livre”, que caracterizou o conteúdo do primeiro processo no qual definiu a forma como eu, meu filho e sua mãe, estabeleceríamos nossas relações.

Quero estar diante de meu filho sem se preocupar com a incerteza se ainda permanecerei alguns minutos a mais ou se amanhã poderei ficar com ele, pelo simples fato de discordar com algum pensamento e ato de sua mãe ou que eu simplesmente seja “julgado” e “condenado” por alguma coisa que tenha feito. Não é certo e muito menos justo que meu filho seja usado pela mãe como instrumento a fim de controlar a minha vida ou golpear meus sentimentos, privando-me de sua presença fora de sua casa, quando for de seu interesse.

Instituí-se, portanto, um estado aflitivo dentro de mim, tomado pelas preocupações. É como se eu estivesse acorrentado a um tormento psicológico, que atinge diretamente a minha auto-estima, que passa a ser apunhalado pelo sentimento de impotência e que tal punição é paga pelo pecado de amá-lo e querer estar sempre ao seu lado.

Ao redirecionarmos o enfoque para os sentimentos da criança, é fato que existem muitas idéias que merecem relevo.

Pensemos então sobre a sensibilidade aguçada da criança em perceber o grau de atenção que recebem de seus pais. Indiscutivelmente ela é capaz de saber quando esta diante de pessoas que oferecem uma presença autêntica e concentrada. A minha persistência, frente a este ponto, resume-se na idéia de que tal condição é pressuposto necessário para se criar as fontes que alimentam com qualidade o clima de amor. Por outro lado, o efeito contrário, ou seja, a falta de encontro autêntico é assimilada por ela como sendo um sinal negativo, podendo ser traduzido como falta de preocupação de seus pais diante das suas ações e sentimentos. Como conseqüência, ela pode interpretar este ato acreditando não ter importância que desejaria receber, passando a se valorizar menos. E uma das maiores preocupações que tenho encontra-se na relação entre esse raciocínio e o sentimento oposto ao amor: a indiferença. Implica que a falta de um contato dos pais entregues por inteiro pode fazer com que os filhos se sintam não amados e inseguros.

Assim sendo, quero estar presente de forma ativa, num encontro verdadeiramente autêntico com meu filho, apoiado em toda empatia que possa existir no mundo, sem me preocupar se estarei sendo rotulado ou não pela sua mãe.

Desta forma, quero transformar esta carta em uma ferramenta capaz de construir os alicerces que, de fato, permitam sustentar as minhas crenças em busca de uma vida com meu filho muito mais saudável e com muito mais qualidade.

Se a justiça divina já me concedeu asas, por meio da existência de meu filho, permitindo alçarmos vôos em direção à felicidade, então, que a justiça humana me conceda a resistência do vento para que esse sonho possa realmente decolar.


Jeanlis Brito Zanatta

Jundiaí, 3 de fevereiro de 2002

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