POR QUE É TÃO DIFÍCIL SER PAI?
Pai deixou de ser símbolo do homem responsável pelo sustento financeiro da família para assumir novas funções dentro do lar; a figura paterna do século 21 se renova em sentimentos e emoções, configurando-se um exemplo de dedicação
Gilson Ribeiro Dacie e a pequena Izabela: viúvo repentinamente, pai assumiu as funções de mãe.
Ser pai sem deixar de ser amigo. Ser herói e ser exemplo. Dedicar seu tempo à família e dividir tarefas. Assim é o pai do século 21 – bem diferente daquele que se preocupava apenas em trabalhar o dia todo para garantir uma estabilidade financeira dentro de casa. Uma maneira “antiga” de amar.
Agora pai trabalha, mas também ajuda em casa. Cuida de negócios e acorda à noite para ajudar a mulher olhar o bebê que acabou de nascer. Continua se preocupando com um futuro melhor para o filho, mas não deixa de reservar um tempo para curti-lo no dia-a-dia. O que vale é estar sempre presente.
Psicólogos e sociólogos confirmam, em entrevista ao jornal BOM DIA, que os pais mudaram muito e, como conseqüência, as famílias também não são mais as mesmas. “Homem e mulher estão em um processo de divisão de funções, seja em casa, no trabalho ou nas contas a pagar. Com isso a relação pai, mãe e filhos também foi alterada”, afirma a psicóloga Tina Zampieri, 55 anos.
Segundo ela, esta igualdade de papéis aproximou a figura paterna do filho. “Os pais do século passado, por exemplo, tinham como conceito de bom pai aquele que tem um bom emprego e condições financeiras de proporcionar uma vida tranqüila para toda a família”, diz, ressaltando que ficava com as mães o dever de cuidar dos estudos, educação e dar afeto aos filhos.
“Não existia uma participação direta da figura masculina no dia-a-dia do filho, a não ser quando era preciso impor respeito e ditar regras”, afirma Tina.
Os pais davam broncas, colocavam os filhos de castigos e davam ordens. Mas quando o assunto era carinho, a maioria deixava a desejar. “Beijar um filho, homem, era algo de outro mundo”, conta.
E quando tudo mudou? Na opinião do sociólogo Ricardo Constante Martins, 35, um dos fatores que mais influenciaram na mudança do perfil do pai ficou visível há cerca de duas décadas, com a entrada das mulheres no mercado de trabalho.
“Trata-se de um fator muito forte culturalmente. As mulheres, que antes casavam, tinham filhos e ficavam responsáveis pela educação, saíram de casa para trabalhar. Com isso o homem foi forçado a assumir responsabilidades que não eram da alçada dele, forçando assim a superação de dogmas machistas”, explica Martins.
Para Tina Zampieri, foi justamente esta superação que resultou na aproximação do pai com o filho. “Eles passaram a conviver mais com a família. Participaram do crescimento dos filhos e se tornaram cada dia mais afetivos e interessados. Deixaram de lado o peso da responsabilidade pelo futuro do filho e estão mais amorosos”, diz Tina.
Até mesmo trabalho doméstico não é mais um “bicho de sete cabeças” para eles. Quantos pais por aí não cozinham por gosto? E muito melhor que as mães, diga-se de passagem. Aliás, muitos deles buscam os filhos na escola, os leva em suas atividades extracurriculares e fazem programas divertidos. Às vezes tudo isso enquanto a mãe está no trabalho.
Para Martins, a participação dos dois na vida dos filhos e a divisão de tarefas é ótima quando a família é bem estruturada. “Os filhos passam a ter duas grandes interferências e absorverão mais informações também”, afirma o sociólogo rio-pretense, acrescentado que está aí a importância da estrutura familiar.
“O pai e a mãe precisam ter idéias parecidas e concepções do que é certo ou errado. Caso nem eles mesmo entrem em um acordo, podem confundir a cabeça dos filhos”, explica Martins.
Prioridades
Quando a maioria dos jovens do século 21 começa a pensar no futuro, uma diferença enorme em relação aos jovens de décadas passadas fica perceptível. A prioridade não é mais casar e ter filhos. Em primeiro lugar, salvo algumas exceções, é a realização profissional.
“Isto explica muitas mudanças no perfil do pai. Alguns, por exemplo, deixam para experimentar a paternidade quando já estão mais maduros e estabelecidos”, afirma Tina Zampieri, lembrando que os casos de pais com mais de 40 anos já é um fato normal.
Martins acrescenta que o avanço da medicina também colabora para esta escolha de uma paternidade tardia. “Não há mais aquela pressa de ser pai ou mãe”, diz.
Legislação
Até mesmo a questão da guarda dos filhos quando um casal inicia processo de separação já não é mais como antes.
Segundo especialistas, antigamente era certo que a guarda ficaria com a mãe e o pai teria horário determinado para visitar o filho. Agora a guarda é compartilhada e, dependendo dos casos, o pai pode ser o ‘guardião’ da tutela.
“Só a existência de um fato muito grave pode fazer com que o pai tenha determinações judiciais para ver o filho. Mas isso também pode acontecer com a mãe. Até o Código Penal ”, afirma o sociólogo.
Permanências
Elas invadiram o mercado, as faculdades e amenizaram o machismo que imperava na sociedade, mas não acabaram com ele definitivamente. Queiram as mulheres ou não, o machismo ainda existe e estão explícitas na criação dos filhos.
Os homens se transformaram em pais amigos, porém não deixaram de ter um zelo especial pelas filhas mulheres – fator comum ao dos pais de todos os tempos.
Assim como nos séculos passados, a criação da filha mulher e do filho homem continua caminhando de forma diferente.
“Se um filho disser em um almoço de família que saiu com várias mulheres no dia anterior, ótimo. Se as palavras vieram da boca da filha mulher, ela será duramente criticada dentro da família”, afirma Martins.
“Podemos dizer que vivemos em uma sociedade machista light”, brinca ele, ressaltando que este é um dos poucos sinais que restaram dos pais antigos. Uma lembrança dos ancestrais que, apesar de tudo, mostra preocupação. Um amor à moda antiga, mas mesmo assim amor de pai.
Viúvo encara papel de mãe
“Ser pai é renascer de novo”. É assim, ao pé da letra, que o contador Gilson Ribeiro Dacie, 33 anos, descreve o nascimento da pequena Isabella Ribeiro e a mudança repentina em sua vida.
Casado há quase seis anos com Gislaine Godoy Ribeiro, 35, Gilson deparou com a morte de sua mulher uma semana após o parto de Isabella, hoje com três meses. Gislaine foi vítima de infecção hospitalar. Naquele momento o contador passou a ser pai e mãe. Isabella agora é sua razão de viver.
“Aprendi a dar banho, trocar fralda, decifrar o choro (se é cólica, sono ou fome) e preparar a mamadeira. O mais interessante foi que comecei a ver nela o que passei quando era criança. É maravilhoso”, afirma ele, enquanto ajeita Isabella em seu colo.
Apesar de fazer quase tudo sozinho, Gilson conta com a ajuda da mãe, dona Neuza, e das professoras da Escola Infantil Sagrado Coração. “Com dez dias coloquei ela na escolinha e levei uma bronca da pediatra. Apostei todas as minhas fichas que daria certo e, meses depois, ela concordou comigo. Foi um sucesso”.
O contador, que não pensa em mais filhos, diz que a cada dia descobre uma felicidade em ser pai. “Não há um dia que seja igual ao outro. Cada dia é um sorriso diferente. Às vezes está brava, às vezes boazinha. Acho que vai puxar a personalidade da mãe”, brinca.
E como explicar a ausência da mãe quando Isabella começar a perguntar? “Vou dizer que ela era mais importante para Deus do que para nós”, diz ele. Em seguida dá um beijo na testa de Isabella e diz ter certeza que Gislaine está olhando os dois.
Maturidade paterna
Pai aos 41 anos e por acidente, mas realizado. É assim que o jornalista Lelé Arantes, 48, descreve sua paternidade. A idéia de ter filhos já estava em seus planos, mas foi no dia do seu aniversário que ele recebeu o melhor presente: a notícia da chegada de Maria Antônia Ferreira Arantes, hoje com 6 anos.
“Sempre quis ter uma menina. Elas são mais carinhosas. A Tico (apelido carinhoso que ele deu a filha) é minha razão de viver”, afirma o escritor, que durante a gravidez da mulher, Regina Célia Ferreira, 45, acompanhou todos os exames de ultra-som e, no dia do parto, desmaiou de emoção.
A partir dali a vida de Lelé mudou. “Acompanhei o crescimento da Maria Antônia, troquei 80% das fraldas e tento, sempre que possível, estar com ela.”
Lelé diz que o fato de ter sido pai mais tarde do que o normal tem dois lados. O primeiro, considera positivo. “Tenho certeza de que, se tivesse tido filho com 25 anos, não teria curtido a Maria Antônio como curto. Quando estamos mais maduros temos muita paciência e, em se tratando de criança, isso é essencial.”
O historiador diz que já viveu tudo o que tinha para viver. “Agora o momento é dela”, afirma, ressaltando que também está no futuro um dos problemas de ser pai na maturidade.
“Depois de uma certa idade começamos a contar quanto tempo temos de vida. As vezes penso se vou estar aqui para ver ela se formar, casar e ter filhos. Peço todo dia para Deus me dar um tempinho a mais aqui para poder viver alguns momentos com ela.”
Ser pai? “A melhor coisa que está acontecendo na minha vida. Todos os dias aprendo alguma coisa diferente com a Tico. É meu tesouro”, diz o jornalista.
Amor além do gene
O engenheiro Marcelo Teixeira da Costa, 36 anos, já pensava em ser pai quando conheceu a arquiteta Germana Zanetti, 37. O sonho se realizou em um piscar de olhos e ele virou pai de João Pedro Zanetti Coser, 3, do dia para a noite. Primeiro veio a conquista, a amizade, a confiança e, em alguns meses o pequeno elegeu o engenheiro seu pai de coração.
“No início do meu namoro com Germana o João Pedro teve um pouco de dificuldade para entender o que estava acontecendo. Deixamos tudo correr naturalmente e a aproximação foi acontecendo de maneira gradativa. Primeiro ele me chamou de Marcelo, depois de tio Marcelo. Ficamos amigos”, conta.
E foi em janeiro deste ano que o engenheiro teve um dos dias mais emocionantes de sua vida. João Pedro chamou sua mãe para “bater um papo” em particular, em seu quarto. Ele costuma fazer isso de vez em quando. Em seguida saiu correndo pelo corredor da casa em direção ao quarto do casal.
“Ele parou na porta do quarto, olhou para mim e disse que queria fazer uma pergunta. Em seguida perguntou se eu era o pai dele de coração. Fiquei muito emocionado e logo respondi que sim. A reação dele foi momentânea e espontânea. Ele saiu pelos corredores da casa gritando que era feliz. Até filmamos de tão bonito que foi. Acredito que para ele foi um alívio saber que ele pode contar comigo também. Uma segurança”.
Marcelo conta que a convivência dos três é totalmente normal, como a de qualquer família feliz. Desde o dia que João Pedro tirou sua dúvida o chama de pai, papai, papaizinho. E também já pede um irmão. O casal promete atender o pedido.
Quanto ao pai legítimo, o casal explica que há pouca convivência. Ele busca o João Pedro para passar a tarde uma vez a cada 40 dias, mais ou menos. Já o casal mudou toda sua rotina e programações para estar sempre com o filho. “Sem dúvida ele é prioridade em minha vida”, garante Marcelo.
Paternidade é paixão
Ser pai na hora de educar e também na de brincar. Dar bronca quando precisar, mas também fazer bagunça. Estar ocupado e, ao mesmo tempo, sempre à disposição. Assim é a paternidade na opinião do empresário Paulo Faria, 35, pai de Jonas, 8, Júlia, 5, e Luiza, 3. “Ser pai é mais do que simplesmente colocar uma pessoa no mundo. Costumo dizer que se trata de uma missão. Uma vocação”, afirma ele, que pensa em mais filhos. “Sempre falei que teria seis filhos. Ainda não desisti da idéia”, diz o empresário, que prova que mesmo com a correria do dia-a-dia é possível ser um ‘paizão’.
“Quando chego do trabalho esqueço todos meus problemas e dedico todo meu tempo para minha família. Às vezes faço programas individuais com eles, atendendo preferências de cada um, e às vezes com toda a família. Assim mostramos a importância de terem opiniões individuais”, afirma.
Faria conta que quando ele e sua mulher, Mariana, 34, tiveram Jonas, chegaram a pensar em não ter mais filhos. Mas por pouquíssimo tempo. “Ter um filho causa um amor tão grande que pensamos ser impossível amar outra pessoa com a mesma intensidade. Parecia que íamos trair o Jonas, mas não há nada disso. Logo vieram as meninas e o amor foi tão grande quanto o que tínhamos pelo Jonas, sem preferências.”
Preocupação? Todas, mas principalmente a de formar pessoas íntegras e de caráter. “Me preocupo muito com o que passar para meus filhos. Quero deixar a eles uma herança de princípios e valores. É preciso mostrar a eles a necessidade de existir um sentido em tudo o que fazemos”, diz.
De acordo ele, essa formação de caráter já é exercitada dentro de casa. “Temos um acordo com as crianças de que para ganhar uma coisa nova elas precisam se desfazer de alguma antiga. Então, se querem um brinquedo novo, elas já sabem que terão de escolher um dos brinquedos atuais para doar”, exemplifica.
Garota celebra Dia dos Pais em dose dupla
Na casa da pequena Theodora Rafaela Carvalho da Gama, 5 anos, o Dia dos Pais é duplo. Isso porque ela é filha do casal Vasco Pedro da Gama Filho, 35, e Dorival Pereira de Carvalho Júnior, 43. Companheiros há 14 anos, homossexuais assumidos e sócios em uma escola de cabeleireiros, eles afirmam que a presença de dois pais não muda em nada a criação.
“Ela é educada, amada e tem responsabilidades como qualquer outra criança. Além disso, conta com a presença de dois pais e de figuras femininas, como a tia e a avó”, afirma Júnior, ressaltando que no ano passado, primeiro Dia dos Pais que passaram juntos, ela estava muito feliz porque tinha os dois.
E se a felicidade da menina é em dobro, Júnior também não esconde a sua. “Sempre quis ter um filho por não ter tido irmãos. A Theodora é meu maior presente”, diz. Mudanças? Todas. “A partir do momento que existe uma criança que depende de você, sua vida muda totalmente. Passei a me preocupar mais até com minha saúde por ela. Quero estar saudável para ver a Theodora crescer e ter filhos”, diz. “Hoje em dia pensamos nela sempre em primeiro lugar. É um amor incondicional, de cuidar e zelar”, explica.
Vasco afirma que os dois estão sempre se policiando para passar o melhor para a filha. “Somos reflexo para ela. Além disso, a idade de Theodora é de aprendizado, de absorver tudo o que lhe é passado. Cabe a nós ensiná-la a diferenciar o certo do errado”, diz.
Na vida de Vasco e Júnior, Theodora é o centro das atenções. “Mataria e morreria por ela”, diz Vasco.
Fonte: http://www.bomdiariopreto.com.br/index.asp?jbd=1&id=59&mat=87065
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