ACOMPANHAMENTO PSICOLÓGICO ÀS VISITAS DE PAIS AOS FILHOS
Quando o casal se separa, é comum que os filhos menores fiquem sob a guarda de apenas um dos pais (guarda monoparental), enquanto o outro fica com o “direito” de visitá-los nos finais de semana, férias, feriados... O rompimento da estrutura familiar faz com que o contato do genitor não-guardião (geralmente o pai) com os filhos se torne escasso e precário, abalando a relação. Além disso, o sistema de visitas é montado de modo a não “atrapalhar” a rotina de convívio dos filhos com o genitor guardião (geralmente a mãe)...
Mas o que dizer-se da situação em que a mãe, enquanto genitora guardiã, interpõe obstáculos e dificuldades para a manutenção desse já frágil contato do pai com os filhos, sem que haja um motivo concreto e legítimo para isso (não houve violência ou descaso do pai para com os filhos, por exemplo)? Configura-se então a instalação da Síndrome de Alienação Parental – o nome é novo, divulgado pela primeira vez pelo psiquiatra norte-americano Richard Gardner, mas é muito freqüente nas questões referentes às visitas aos filhos e às pensões alimentícias. Como o objetivo é destruir o vínculo entre o pai e os filhos, a situação familiar estrutura-se de modo a que o pai torne-se secundário ou periférico, ou quando muito mero provedor da pensão alimentícia, até sua completa extinção no significado simbólico dos filhos.
Inicia-se um trabalho de denegrir a imagem do pai perante os filhos, para reduzir a importância deste em suas vidas. A mãe utiliza uma série de argumentos dela (e não das crianças) para mostrar que o pai não é digno de afeto – a mãe recorre a um referencial simbólico do ex-marido ou ex-companheiro como responsável único pelo fracasso da vida conjugal, porque recusa-se a observar e/ou admitir que esse tipo de relação envolve responsabilidade mútua de ambos, e transfere-o aos filhos, que são vistos como extensão de si mesma e incapazes de ter autonomia afetiva. O resultado disso é um pacto de lealdade inconsciente entre a mãe e os filhos, para atender exclusivamente aos interesses dela, e não das crianças.
Devido à dependência material (estar sob o mesmo teto) e principalmente à afetiva que as crianças mantêm com a mãe, esse pacto de lealdade inconsciente consolida-se na destruição do vínculo com o pai. Há um temor (consciente ou inconsciente) de serem rejeitadas ou abandonadas pela guardiã, para ficarem com o pai que é visto como negativo para elas (por influência da mãe, é claro!). Assim, as crianças aprendem também a mentir e distorcer os fatos, como mecanismo de defesa para manipular as pessoas à sua volta para agradá-las e com isso satisfazerem aos interesses que são falsamente reconhecidos como legítimos.
Aliás, vale dizer que, diante de situação tão conflituosa como essa, as crianças aprendem a utilizar mecanismos de defesa para “tentar lidar” com as angústias: negam o conflito, afirmando que rejeitam o pai por opinião própria e não por influência da mãe; deslocam para os familiares do pai o ódio injustificado que a mãe implantou contra este; podem nutrir sentimentos de menos-valia, através de comportamentos regressivos e infantilizados (dificuldades e retrocessos de aprendizagem, urinar na roupa e/ou na cama, prisão de ventre como significado de reter o afeto e as idéias nocivas do genitor guardião por medo da rejeição e abandono, comportamentos “resistentes” à presença do pai, como objeto transferencial depositário de conteúdos negativos implantados pela mãe, entre outros) por não sentirem-se capazes de lidar com a situação de maneira mais madura e adequada.
Poder-se-ia complementar a análise, afirmando que quando o genitor guardião assume esta postura diante dos filhos, pode estar manifestando características esquizóides de dissociação do objeto em dois: um depositário de conteúdos positivos e outro de conteúdos negativos, sendo que, devido ao ódio que sente, e à dificuldade em assumir uma postura responsável diante da insatisfação de suas fantasias e expectativas inconscientes do início do relacionamento, prefere transferir ao outro a “culpa” exclusiva pelo fracasso, e a figura negativa se sobrepõe à positiva, gerando então sentimentos de angústia persecutória – o outro é visto como uma permanente “ameaça” aos seus planos, projetos, crenças e convicções.
Ë nesse contexto que se faz necessário e urgente o acompanhamento psicológico dos filhos diante da situação de Alienação Parental. Através da compreensão de todo o contexto familiar que se apresenta, o psicólogo pode sugerir medidas que visem não apenas o restabelecimento do vínculo com o pai, como também a substituição da imagem simbólica negativa desse pai implantada por influências externas, por uma imagem mais adequada e condizente com a realidade e necessidades dos filhos – um ser humano, passível de falhas, mas com qualidades suficientes para estabelecer e manter um vínculo positivo com os filhos, mesmo que o conto físico não seja tão freqüente assim.
A psicoterapia poderá auxiliar as crianças a observarem a situação sob uma óptica mais concreta e realista, retirando a obscuridade que o genitor guardião tentou impor sobre o não-guardião. Torna-se uma importante ferramenta para identificar a origem dos conflitos e orientar como lidar com eles – com isso, favorecendo também o desenvolvimento e amadurecimento emocional, suficiente para lidar também com todas as demais situações da vida. Isso evitará que, no futuro, as crianças apresentem dificuldades maiores em determinados aspectos, quando se conscientizarem da injustiça que “cometeram” com o genitor não-guardião. No caso do genitor guardião que iniciou o processo de Alienação Parental, a psicoterapia será útil para que a pessoa se conscientize de que suas expectativas podem ser irreais, e por isso difíceis de serem satisfeitas, e não há “culpa” ou “culpado” único, e sim “responsabilidade mútua” pelo andamento da relação. Esse é o princípio de uma estruturação plena e madura da personalidade e do grupo familiar.
Denise Maria Perissini da Silva – psicóloga clínica e assistente técnica jurídica civil.
Autora do livro Psicologia Jurídica no Processo Civil Brasileiro. São Paulo: Casa do Psicólogo Editora, 2003.
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