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GUARDA COMPARTILHADA: UMA NOVA PERSPECTIVA SOBRE OS INTERESSES PSIC... (1-2)

GUARDA COMPARTILHADA: UMA NOVA PERSPECTIVA SOBRE OS INTERESSES PSICOLÓGICOS, SOCIAIS E CULTURAIS DO MENOR INTEGRANTE DE FAMÍLIAS MONOPARENTAIS


FACULDADE DE DIREITO DE PRESIDENTE PRUDENTE – CURSO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS


Trabalho monográfico apresentado no curso de graduação em Ciências Jurídicas como requisito parcial para sua conclusão.
Área de concentração: Direito Civil. Direito de Família.
Orientadora:
SHIRLEY DE OLIVEIRA LIMA NOMURA
Presidente Prudente – SP
2002



FICHA CATALOGRÁFICA

342.121 Taveira, Carlos Alberto Atência.
T232g Guarda Compartilhada: Uma Nova Perspectiva Sobre os Interesses Psicológicos, Sociais e Culturais do Menor Integrante de Famílias Monoparentais/ Carlos Alberto Atência Taveira. Unoeste, 2002.


Monografia de Graduação

1. Direito Civil. Direito de Família. I. Carlos Alberto Atência Taveira. II. Guarda Compartilhada: Uma Nova Perspectiva Sobre os Interesses Psicológicos, Sociais e Culturais do Menor Integrante de Famílias Monoparentais.


Dedico este trabalho ao meu pai, Alberto, exemplo de caráter e dedicação ao trabalho que, com muita coragem, labuta e compreensão, sem medir esforços ou economias, me proporcionou a oportunidade de chegar a esse ponto. A minha mãe, Marice, que sempre me deu todo o incentivo e carinho de que precisei nos momentos de vacilo, nunca me permitindo desistir de minha jornada. A meu querido e amigo irmão Luis Antônio (in memorian), que fazia questão de mostrar a todos seu orgulho por ter um irmão estudante de Direito (saudades). Meu amor, carinho e agradecimento a todos.


Aos meus pais, que sempre fizeram o possível e o impossível para me auxiliar na realização desse trabalho.
A minha professora orientadora, Dra. Shirley Oliveira Lima Nomura pelo esforço e tempo dispensados no aprimoramento de meus conhecimentos e pela paciência dispensada nesse projeto.
A todos que foram meus professores, em especial aos de Direito Civil, matéria pela qual me apaixonei. Ao professor Valdomiro de Alcântara, pelo seu imenso amor ao saber e pelo carinho e dedicação com que nos guia ao conhecimento.
A meus filhos, Jacqueline e João Marcos, que foram meu principal estímulo nos momentos de desanimo. Amo vocês.




RESUMO
No presente estudo tentamos vislumbrar os principais aspectos desse novo instituto denominado “guarda compartilhada”, que infelizmente é pouco conhecido no Brasil. Os litígios entre casais acabam, muitas vezes, relegando à segundo plano justamente aqueles que geralmente são os mais prejudicados em toda a questão, ou seja, os filhos resultantes da união desfeita. Assim, a partir do momento em que se encontra falida a união conjugal, novo litígio se apresenta: qual dos genitores deterá a guarda dos filhos menores? Nesse contexto, surge a figura da guarda compartilhada que atende de forma mais eficiente aos interesses das crianças, ampliando, inclusive, a presença dos pais junto a elas. Na atualidade, o envolvimento dos pais na criação de seus filhos leva-os a lutar cada vez mais pela guarda, e a aceitar o compartilhamento com a genitora da criança. Por isso, a necessidade de se adaptar as leis para que atendam a crescente demanda de pais separados. A guarda compartilhada ou conjunta é um dos meios de exercício da autoridade parental, para os pais que desejam continuar a relação com seus filhos, quando fragmentada a família. É um chamamento aos pais que vivem separados para exercerem conjuntamente esta responsabilidade. As justificativas para o estudo aprofundado do tema estão na própria realidade social e judiciária, o que reforça a necessidade de garantir o melhor interesse das crianças e a igualdade entre homens e mulheres em sua responsabilidade pelos filhos. A continuidade do convívio da criança com ambos os pais é indispensável para o desenvolvimento emocional da criança de forma saudável. Por isso, não se pode manter sem questionamentos, formas de solucionar problemas tão ultrapassados, sendo este o principal objetivo do presente estudo.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO E CONCEITO 09

1 DO PÁTRIO PODER 11

1.1 Definição e Posicionamento no Direito Brasileiro 11
1.2 Caracteristicas do Pátrio Poder 12
1.3 Sujeitos do Pátrio Poder 13
1.4 Delegação do Pátrio Poder 14
1.5 O Patrio Poder em Relação a Pessoa do Filho 14
1.6 O Pátrio Poder em Relação aos Bens do Filho 16
1.7 Extinção do Pátrio Poder 17
1.7 Destituição e Suspensão do Pátrio Poder 18

2 DA TUTELA 21

2.1 Conceito e Generalidades 21
2.2 Espécies 22
2.3 Regulamentação 25
2.4 Da Cessação da Tutela 30

3 DA GUARDA 32

3.1 Noções Gerais 32
3.2 Formas de Constituição da Guarda 33
3.3 A Guarda na Separação de Fato 35
3.4 A Guarda na Separação Consensual 36
3.5 A Guarda na Separação Contenciosa 36
3.6 A Guarda no Estatuto da Criança e do Adolescente 37
3.7 Guarda Provisória e Guarda Definitiva 38
3.8 Revogação, Perda, Modificação e Extinção da Guarda 39
3.9 A Guarda e o Direito Previdenciário 40
3.10 A Guarda e o Direito de Visitas 40
3.11 Modalidades de Guarda 42

4 DA GUARDA COMPARTILHADA 45

4.1 Introdução ao Tema 45
4.2 Conceito, Definição e Generalidades 46
4.3 A Guarda Compartilhada no Direito Comparado 50
4.4 A Guarda Compartilhada no Direito Brasileiro 53
4.5 Vantagens e Desvantagens da Guarda Compartilhada 60
4.5.1 Efeitos positivos 61
4.5.2 Efeitos negativos 62

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS 67

BIBLIOGRAFIA 69


1) DO PÁTRIO PODER


1.1) Definição e Posicionamento no Direito Brasileiro
O instituto do pátrio poder, visto em outra época como um direito subjetivo dos genitores, passou a ser visto em nossos dias como um “poder-dever”, exercido conjuntamente pelo pai e pela mãe, por delegação do Estado, visando os interesses da família. Assim considerado, podemos defini-lo como sendo a soma dos direitos e deveres concedidos aos pais, para que possam desempenhar os encargos que a lei lhes confere, no que diz respeito à criação, educação e administração dos bens dos filhos. Tanto o pai quanto à mãe o exercem em favor de todos os filhos, inexistindo, após nossa Constituição de 1988, qualquer distinção entre eles. E mais, considera-se derrogado o artigo 380 do Código Civil Brasileiro em face do artigo 226, § 5º da Constituição Federal. Aquele dispositivo infraconstitucional, que delegava o exercício do pátrio poder ao pai, com a colaboração da mãe, não vige mais em sua totalidade, pois diante da consagração do princípio da isonomia (Constituição Federal, art. 5º, inc. I), a autoridade parental pertence a ambos os cônjuges, sendo que, posteriormente, esse princípio foi consagrado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente em seu artigo 21, que prevê que o pátria potestas deverá ser exercido da mesma forma pelo pai e pela mãe, retirando, assim, a normatização da matéria do Código Civil e chamando-a para si. Essa consagração ao princípio isonômico sobre o instituto do pátrio poder já era prevista por Clóvis Bevilaqua que há mais de cinqüenta anos já comentava em sua notória obra:

Pátrio poder é complexo dos direitos que a lei confere ao pae, sobre a pessôa e os bens dos filhos. [...] Ambos os cônjuges tem sobre o filho autoridade. A ambos deve o filho respeito. [...] O marido não absorve a personalidade da mulher, a autoridade do pae não faz desapparecer o direito da mãe2.


Nota-se daí que o autor já consagrava a autoridade parental como pertencente a ambos os cônjuges, sendo que, tal previsão foi definitivamente consolidada em nossa Constituição Federal de 1988.


Sobre o instituto, o poder público exerce função meramente fiscalizatória, podendo suprir, em casos especiais, as faltas ou abusos em que o detentor do poder-dever venha a incorrer, sendo que, daí decorre a idéia de que o pátrio poder é um múnus público.


1.2) Características do Pátrio Poder

Por tratar-se de um direito de família puro, indisponível, do qual não se pode abrir mão, o pátrio poder possui algumas características que lhe são intrínsecas:
a) é indisponível: os pais não podem abrir mão dele uma vez que, para o menor é imprescindível, ou seja, é uma condição existencial, oriunda da enorme fragilidade e insuficiência do homem, que durante certo período de sua vida não pode viver sem a assistência de seus semelhantes, pois estes lhe garantem o recebimento da assistência que lhe é devida, seja de cunho material, psíquica ou espiritual;
b) é irrenunciável: uma vez que se trata de um dever-função, a cargo dos pais, que não podem subtrair-se ao dever de proteção dos filhos. Além disso, o filho tem direito a um estado de família, que é uma relação subjetiva, pessoal por sua natureza não temporária, fonte de direitos, deveres e poderes que não dependem da mera vontade do sujeito e que, por se tratar de um instituto regido por normas de ordem pública, são oponíveis contra todos;
c) não pode ser transferido a outrem: entretanto o filho poderá ser confiado a terceiro para ser educado e criado sob tutela, permanecendo o genitor penalmente responsável pela entrega à pessoa inidônea;
d) são intransacionáveis: o pátrio poder corresponde ao desempenho de um encargo personalíssimo, adstrito à observância de deveres que, pelo fato de serem deveres, não podem ser renunciados, sendo incompatível com a transação;
e) é imprescritível: pois como instituição, se encontra fora do comércio, sendo, portanto, normas de ordem pública. Mesmo que, por qualquer circunstância, não possa ser exercido por seus titulares, continua a ser um direito imprescritível.



1.3) Sujeitos do Pátrio Poder

a) Sujeitos ativos
Na constância do casamento deve ser exercido em igualdade de condições por ambos os pais, conjuntamente.
Havendo separação de fato, aquele que for detentor da guarda do filho menor exerce o poder paternal em sua plenitude, restando ao outro o direito de visita e vigilância. Nas palavras de Bevilacqua:

A separação dissolve a sociedade conjugal, porém não a parental entre paes e filhos, cujos laços subsistem, apenas modicficados, tanto quanto o necessário para atender-se a separação dos cônjuges e a necessidade de conservar os filhos na companhia do inocente, ou daquele a quem couber esse direito3.

No caso de falecimento de um dos cônjuges, o sobrevivente exercerá o poder paternal plenamente (art. 382, Código Civil). No caso do sobrevivente ter sido destituído ou não puder exercê-lo por qualquer motivo, deverá ser nomeado um tutor ao menor. Antes da Lei 4.121/62 (Estatuto da mulher Casada), a bínuba perdia o pátrio poder em relação aos filhos do leito anterior.
Na separação judicial e no divórcio, nenhum dos pais é destituído do poder paternal, havendo alteração apenas quanto à guarda, que ficará com um deles, limitando o exercício do poder paternal por parte do outro.

b) Sujeitos passivos
Segundo o disposto no artigo 379 do Código Civil, são sujeitos passivos do poder paternal os filhos legítimos, os legitimados, os legalmente reconhecidos e os adotivos, enquanto menores. Com o advento da Constituição Federal de 1988 (art. 227, § 6º), ficou proibida qualquer discriminação entre filhos, independente de sua origem e, tal proibição encontra reforço na Lei 8.560, de 29 de dezembro de 1992, em seu artigo 5º, que proíbe qualquer referência à natureza da filiação no assentamento do registro de nascimento.


1.4) Delegação do Pátrio Poder

Encontra-se abolida em nossa legislação a delegação do pátrio poder, que era anteriormente disciplinada nos artigos 21, 22 e 23 do Código de Menores, revogado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. “Assim, sendo possível que, com a concessão da guarda, o guardião represente o menor, não há mais necessidade da delegação do pátrio poder”4. A permissão para que o juiz possa deferir o direito de representação ao guardião para a prática de determinados atos é uma novidade introduzida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 33, § 2º) , pois, até seu advento, a representação competia exclusivamente aos pais, tutores e curadores.

1.5) O Pátrio Poder em Relação a Pessoa do Filho

Aos genitores é incumbido, em primeiro lugar, dirigir a criação e educação do filho. Havendo descumprimento de tal dever, o faltoso estará sujeito às sanções das leis civil e penal (abandono material, moral e intelectual – artigos 244 a 246 do CP). Cabe ainda aos pais dirigir espiritual e moralmente os filhos, formando o seu caráter e dando-lhes uma formação religiosa. Observa o Eminente Prof. Washington de Barros Monteiro que os “genitores devem zelar pela formação dos filhos, para torná-los úteis a si, à família e à sociedade”5. O que se espera é que os pais exerçam o pátrio poder visando o pleno desenvolvimento da personalidade do filho assim como sua proteção integral. Segundo a disposição do inc. II do art. 384 do CC, os pais tem o direito de ter o filho em sua companhia e guarda, fator esse que constitui elemento indispensável para o cumprimento do dever de educar, obrigação essa que dificilmente poderá ser cumprida satisfatoriamente a longa distância ou durante prolongados períodos de ausência. Mas, no caso de separação, somente um dos pais terá a guarda, o que não deve constituir um óbice para que o menor tenha em sua companhia o outro genitor, na medida e sempre que possível, pois se trata de um direito do menor e como tal, deve ser exercido.
Por força do artigo 384, inc. II do CC, os pais podem conceder ou negar consentimento para os filhos se casarem sendo que, em caso de negativa, os filhos poderão recorrer ao judiciário para que este supra a vontade de seus genitores. Ensina Washington de Barros Monteiro que, “tal consentimento deve ser manifesto de forma específica, para se casar com determinada pessoa”6. Tal consentimento visa a proteção do menor, visto que o casamento só deve ocorrer quando for conveniente, ou seja, quando estiver suficientemente maduro para se aventurar nos perigos de uma paixão que brevemente poderá se mostrar frágil e efêmera.
A faculdade de nomear tutor (art. 384, IV, CC), visando o cuidado com a prole é pouco utilizada por nós, pois sendo um dos pais vivo, exercerá ele o pátrio poder. A nomeação somente ocorrerá se, o genitor sobrevivente tiver sido suspenso ou destituído do pátrio poder . Encontrando-se interditado o guardião detentor do pátrio- poder , aplica-se o disposto no artigo 458 do CC, ou seja, a autoridade do curador se estende a pessoa e bens dos filhos do curatelado.
A representação dos filhos se estende até que estes completem dezesseis anos, após, até os vinte e um anos, há a assistência. Os atos praticados por menor de dezesseis anos sem a devida representação serão nulos e, os atos praticados por menores entre dezesseis e vinte e um anos, sem a devida assistência serão passíveis de anulação (arts. 145, I e 147, I do CC).
Em face do direito de guarda os pais poderão reclamar os filhos de quem ilegalmente os detenha, sendo o meio adequado para fazer valer este direito, a busca e apreensão (art. 384, IV, CC) . Se o litígio ocorre entre um genitor e o outro, o meio mais apropriado será a ação de modificação de guarda, reservado-se a busca e apreensão nesse caso, para os extremos, em que o menor está sendo ou poderá ser prejudicado.

Não se deve pensar que ao menor são assegurados apenas direitos, pois obrigações também são ocorrentes, como o dever de obediência dos filhos em relação aos pais e a prestação de serviços condizentes com sua idade e capacidade, devendo-se observar sempre a moderação, pois, qualquer abuso pode levar a suspensão ou perda do pátrio poder, sem prejuízo das demais sanções penais. Segundo o mestre Ney Almada de Mello:

Tanto a natureza , em seus imperativos cristalinos, quanto o Direito asseguram aos titulares do pátrio poder o direito de exigir que seus filhos lhe prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição. Nas camadas economicamente humildes de nossa população, desde os tenros passos da infância, já os filhos ajudam os pais no trabalho, por vezes penosamente. Tanto assim que a jurisprudência tem concedido indenização quando a vida do menor é sacrificada em conseqüência de ato ilícito, estimando, ainda que potencialmente, sua capacidade de cooperação na vida econômica do lar7.


1.6) O Pátrio Poder em Relação aos Bens do Filho

Existem várias disposições a respeito da administração de tais bens em nosso direito (arts. 385 a 391, CC), sendo que, nesses casos, o poder paternal é conferido aos progenitores com a finalidade de conservação e melhoria do patrimônio. Trata-se de um poder de gestão e, assim sendo, todos os atos que importem em diminuição patrimonial, ônus ou compromisso lhes são vedados. Aquele que recebe o pátrio poder deve administrar os bens do filho como um negociante leal e honesto, sendo que os poderes que detém não envolvem o de se disporem dos mesmos.

Os pais não podem alienar, hipotecar, ou gravar de ônus reais os imóveis dos filhos, salvo com autorização do juiz, nem podem contrair, em nome deles, obrigações que ultrapassem o limite da simples administração, exceto por necessidade ou evidente utilidade da prole, também mediante autorização judicial8.

O artigo 386 do CC restringe, assim, o exercício da administração impondo proibições que visam evitar a redução patrimonial dos filhos menores.

Diante do princípio da igualdade constitucional, tal incumbência cabe a ambos os pais, salvo exceções legais, sendo que, o direito de administrar não confere aos progenitores o direito à remuneração.

Colidindo os interesses de pais e filhos, ressalva o art. 387 do Código Civil que aos menores será nomeado curador especial, que terá por função a incumbência de gerir e, se for o caso, defender em juízo os bens do menor.
Se acaso os titulares do poder paternal praticarem atos prejudiciais aos menores, caberá a esses, seus herdeiros ou, então, ao representante legal, em caso de cessação do pátrio poder, a ação para anulá-los.
Na hipótese de incidência do artigo 391 e incisos do Código Civil, ou seja, os bens deixados ou doados com exclusão do usufruto paterno, bem como aqueles deixados para fim certo e determinado, como a educação do menor, por exemplo, surgem diferentes hipóteses.
O inciso I, que trata de bem adquirido pelo filho ilegítimo antes do reconhecimento, tem-se entendido que não pode mais perdurar tal exclusão pois, não sendo mais possível rotular a espécie de filiação, os genitores certamente terão os mesmos direitos e deveres, desde que no exercício do poder paternal.
O inciso II trata dos bens adquiridos pelo filho no exercício do serviço militar ou outras atividades.

Aqui se encontra um resquício da velha teoria romana dos pecúlios [...] em que o filius familias não tinha capacidade de ser o titular de um patrimônio [..] e aos poucos lhe foi reconhecida à prerrogativa de fazer seu aquilo que obtinha na atividade militar (Pecúlio Castrense) e o que vinha a adquirir por outros meios (Pecúlio Adventício e Profectício)9.

O inciso III se refere aos bens doados ao filho sob a condição de não serem administrados pelos pais. É exemplo desta hipótese os bens deixados por pais separados, para impedir que o outro tenha a administração.
O último inciso trata da hipótese em que os pais foram excluídos da sucessão por indignidade. Aliás, segundo o artigo 1.602 do Código Civil, o indigno não tem direito ao usufruto e administração dos bens que a seus filhos couberem por herança (quando herdam por representação), além de perderem o direito a sucessão desses bens. Para Silvio Rodrigues:

O motivo é óbvio, pois se o indigno pudesse administrar ou ter o usufruto dos bens do filho, em sucessão de que foi excluído estaria ele sendo parcialmente punido pois, a pena sobre ele imposta estaria destituída de parte de sua eficácia10.

1.7) Extinção do Pátrio Poder

A extinção do pátrio poder ocorrer por força da lei, de acordo com os vários casos previstos nos incisos do artigo 392 do Código Civil. A primeira hipótese cuida da morte dos pais ou do filho menor, quando ocorre a perda do objeto.
Assim, falecendo um só dos cônjuges, o pátrio poder se concentrará nas mãos do cônjuge sobrevivente. A segunda hipótese trata da emancipação, que equipara o menor ao maior com capacidade para todos atos da vida civil, não havendo qualquer restrição e, sendo os pais vivos, ambos deverão concedê-la, não se justificando a concessão por apenas um dos genitores, nos termos do artigo 21 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Em caso de discordância poderão recorrer ao judiciário e, na falta de um genitor, o outro poderá fazê-lo sem restrições, sendo fundamental para tanto que o filho tenha 18 anos completos. O inciso III, trata da maioridade civil, que extingue o pátrio poder pelo mesmo motivo que a emancipação, pois há uma presunção jurídica de que, devido à maturidade, o filho não necessita mais da proteção paterna. Assim, cessada a incapacidade, não mais subsistirá a relação de pátrio poder. A última hipótese tratada pelo artigo 392 é a da adoção, quando os pais naturais perdem o pátrio poder, que por sua vez transmite-se aos pais adotivos sendo que, mesmo que esses venham a falecer, não retornará aos pais biológicos . O que ocorre é que, devido à integração do adotado à nova família, como se fosse filho do adotante, surge um efeito extintivo, ou seja, “o adotado se afasta da família biológica, com conseqüente extinção de todas as relações com seus ascendentes e colaterais naturais, salvo no que se refere aos impedimentos matrimoniais”11. Nestas hipóteses não há como retornar ao status quo ante.

1.8) Destituição e suspensão do pátrio poder

“Há casos em que o pátrio poder poderá ser suspenso e até mesmo retirado, sendo que, nenhum desses casos é perpétuo. Poderá haver inversão, caso desapareça o motivo que o ensejou”12.
Embora o pátrio poder seja uma relação que deva existir enquanto perdurar a menoridade civil, os pais podem ser dele afastados com a suspensão ou com a destituição. “Tanto uma como a outra devem ser fundamentadas, observando-se com rigor os casos expressos em lei pois, sendo um direito dos pais em relação aos filhos, não se lhes pode arrebatá-los sem que ocorra uma das hipóteses legais”13.
Os casos de destituição (ou perda), e suspensão do pátrio poder estão elencados respectivamente nos artigos 394, § único e 395, do Código Civil. A suspensão se dá quando ocorre abuso no exercício da potestas , faltando os pais com seus deveres ou arruinando os bens dos filhos. Trata-se de norma genérica e portanto, deve-se observar se a atitude dos pais ou de um deles é prejudicial ao desenvolvimento normal do menor. Nessas hipóteses, deve-se provar que houve culpa dos pais para que se opere a suspensão. A condenação por crime doloso com pena superior a dois anos também poderá ser caso de perda do pátrio poder, que somente ocorrerá se esses crimes se derem nas pessoas dos filhos ou se forem relativos a assistência familiar. Nesta hipótese, no que diz respeito à suspensão, trata-se de medida provisória, subsistindo enquanto perdurar a causa que a determinou. Ademais, a suspensão poderá atingir apenas um ou alguns dos filhos, sem que atinja toda a prole (quando baseada na falta de cumprimento dos deveres ou no caso de arruinar os bens dos filhos).

Por outro lado, para que ocorra a destituição é necessário que haja culpa, pois se trata de medida definitiva, que se opera nos casos de castigo imoderado à prole ou pelo abandono e que, no caso, não se deve limitar apenas a questão material, mas também intelectual, ocasionando, inclusive, a perda do usufruto dos bens do menor. São igualmente causas que levam a suspensão do pátrio poder a prática de atividades contrárias à moral e aos bons costumes, sendo que tais atos devem ser perniciosos e maléficos para os filhos; concorrência dos pais para que o menor não complete sua alfabetização; autorização para trabalharem em lugares perigosos ou insalubres ou em serviços prejudiciais a sua moralidade.
A diferença existente entre destituição e suspensão do pátrio poder reside nos conceitos de temporalidade e disponibilidade. Assim a destituição é de caráter permanente e compulsório, sendo extensiva a todos os filhos. Já a suspensão é transitória e facultativa. Desaparecendo a causa que a originou, retorna-se ao exercício do pátrio poder, sendo necessário para tanto que um dos pais ou ambos intentem ação com o objetivo de retornarem a situação anterior. Modernamente tem-se decidido que, mesmo no caso de destituição, os pais poderão recuperar o pátrio poder desde que cessadas as causas que a determinaram e recuperada a sua idoneidade.
Esta sanção tem por objetivo punir os atos presentes. Não abrangem os fatos pretéritos. A lei zela pelo menor, não permitindo que este fique com pais descuidados, viciados ou brutais. “Observe-se, por fim, que as causas de extinção operam ipso jure, ou pelo Ministério da Lei, enquanto as da perda ou suspensão operam Ministério Judicio, ou por sentença judicial”14.




2) DA TUTELA


2.1) Conceito e Generalidades

A tutela é o instituto que tem por finalidade suprir a ausência do pátrio poder através da investidura de alguém nos poderes necessários para tanto. Segundo disposição do artigo 406 do Código Civil, os filhos menores serão submetidos a tutela quando: a) seus pais falecerem ou se forem julgados ausentes; b) decaírem do pátrio poder. A proteção legal do menor é exercida primeiramente através do pátrio poder, mas, não havendo quem o exerça, este é substituído pelo instituto da tutela. Assim sendo, havendo um menor que não tem pais ou cujos pais perderam o pátrio poder, deverá ser posto sob tutela. Trata-se de um encargo, um múnus publico, uma delegação do Estado conferida através de lei a uma pessoa capaz, com a finalidade de cuidar da pessoa do menor e administrar seus bens através dos institutos da representação (enquanto absolutamente incapaz), ou assistência (quando relativamente incapaz), suprindo assim suas incapacidades nos atos da vida civil. Trata-se de um encargo obrigatório, salvo as hipóteses dos artigos 414 e 415 do Código Civil. Na definição de Arnold Wald, “A tutela e a curatela são institutos que visam suprir as incapacidades de fato existentes, permitindo a representação ou assistência do incapaz, a administração de seus bens e o auxílio que for necessário para sua manutenção, criação e educação” 1.
Em nosso direito, a tutela é um sucedâneo do pátrio poder, sendo, portanto, incompatível com este. Assim, vindo os pais a recuperar o pátrio poder ou, surgindo este com a adoção ou o reconhecimento de filho havido fora do casamento, a tutela cessará. “A tutela constitui ato suplementar do pátrio poder; se este se estabelece, ou se restabelece, cessa a primeira automaticamente “2.
A pessoa que exerce esse encargo é denominado tutor e o menor posto sob sua guarda denomina-se pupilo ou tutelado. O tutor é, em nosso direito, o único órgão ativo da tutela, ao contrário de algumas legislações, como a francesa e a alemã, que, ao lado da figura do tutor admitem a figura do pró – tutor e do conselho de família.

Quem exerce a função não adquire a condição de funcionário público, mas se investe num cargo que corresponde a alta missão social, no exercício do qual empresta a sua ação para que se efetive o dever do Estado de guardar e defender os órfãos. Por isso na estruturação da tutela envolvem-se preceitos de direito público e de direito privado3.


Pelo mesmo motivo e pela dignidade do ofício desempenhado pelo tutor não permite a lei que ele seja remunerado.
Sendo a tutela um instituto protecional, caberá ao tutor, sob inspeção judicial, reger a pessoa do menor, representá-lo, velar por sua pessoa e administrar-lhe os bens (artigo 422 do Código Civil).

2.2) Espécies
Quanto as espécies, as formas ordinárias de tutela em nosso ordenamento jurídico encontram-se disciplinadas nos artigos 407 à 410 do Código Civil e são as seguintes: testamentária, legítima e dativa. Há também a tutela do menor abandonado que se encontra disciplinada no artigo 412 do mesmo codex. Fala-se também em tutela de fato – ou irregular – onde o menor é entregue a pessoa estranha por ordem do juiz. Tal pessoa não é nomeada tutor e seus atos consistem em uma mera gestão de negócios. Nesse capítulo será apresentada uma sucinta explanação sobre cada uma dessas espécies supra citadas.
Tutela testamentária é aquela que atribui ao pai, à mãe, e aos avós paternos e maternos o direito de nomear tutor - segundo uma ordem preferencial - encontra-se disciplinada nos artigos 407 e 408 do Código Civil.
Dessa forma, compete em primeiro lugar aos pais o direito de nomear tutor, seguido pelo avô paterno e depois pelo avô materno, sendo que, cada uma dessas pessoas poderá exercer tal direito por disposição de última vontade na falta ou incapacidade das que lhe antecedem.
Na opinião de Orlando Gomes, “quanto aos avós, a permissão é um resíduo injustificável do direito anterior, pois no direito atual não exercem o pátrio poder sobre os netos”4.
Atualmente, diante da igualdade constitucional introduzida pela Constituição Federal de 1988 em seu art. 5º, inc. I e da paridade no exercício do pátrio poder, previsto no artigo 226, § 5º da Magna Carta, não mais perdura a preferência ao pai, , conforme o estabelecido no art. 407 do Código Civil, sendo evidente que, na ausência de um dos genitores a nomeação caberá exclusivamente ao outro. Na separação judicial ou no divórcio, será inválida a nomeação feita pelo cônjuge guardião se contestada pelo outro. Pelo mesmo princípio constitucional que prevê a isonomia entre homens e mulheres a preferência entre os avós paternos e maternos encontram-se eliminadas.
Tutela legítima é a que ocorre quando não existe tutor nomeado através de testamento ou outro documento autêntico (codicilo, carta de última vontade, etc.), e recai sobre os parentes consangüíneos do menor pois ora, tendo estes o direito à reclamar alimentos e de serem chamados a sucessão, justo é que suportem tal situação jurídica. Tais parentes serão chamados segundo ordem preferencial, disposta no art. 409 do Código Civil, que da seguinte forma dispõe: 1) o avô paterno; o avô materno; 3) as avós (paterna ou materna); 4) os irmãos (preferindo-se os bilaterais aos unilaterais, do sexo masculino ao do feminino e os mais velhos aos mais moços) e, 5) os tios (preferindo-se o do sexo masculino ao do feminino e o mais velho ao mais moço). Note-se que a preferência ao sexo masculino estabelecida pelo legislador, contemporaneamente não mais se justifica diante dos dispositivos constitucionais anteriormente citados sendo que, no entanto, continuam válidas as prefêrencias dos irmãos bilaterais em detrimento dos unilaterais e a dos irmãos e tios mais velhos em detrimento dos mais moços. A ordem estabelecida pelo artigo não é taxativa, podendo o juiz através do poder discricionário que lhe é conferido por lei para resguardar os interesses do menor, alterá-la ou escolher pessoa idônea estranha a família se para o bem e maior segurança do menor. Na excelente lição de Washington de Barros:
essa ordem não é inflexível; pode a autoridade judicial invertê-la, se assim julgar necessário aos interesses do menor. [...] pode o juiz, em benefício do menor, deixar de observar a ordem prevista em lei para ser deferida a tutela, quando não existem laços afetivos e não demostre o parente qualquer interesse pelo incapaz. Igualmente se o juiz verifica que o parente com preferência legal não tem notoriamente a necessária idoneidade, ou que a investidura é inconveniente para o menor [...]. Em igualdade de condições, porém, deve ser atendida a prioridade5.

Por fim, cumpre ressaltar a importante observação de João Andrade Carvalho, segundo o qual, “o termo tutor legítimo poderia sugerir a existência de tutores ilegítimos dentro do ordenamento jurídico. Mas assim não é. O adjetivo legítimo foi traduzido literalmente do latim pelo legislador. Legitimus, legitima, legitimum significa exatamente “conferido por lei”6.
A tutela dativa, regulamentada pelo art. 410 do Código Civil é aquela que ocorre quando não há tutor testamentário ou não existe a possibilidade de se nomear parente consangüíneo do menor, seja porque não existem, seja porque, existindo, não apresentam a idoneidade necessária para o exercício desse múnus ou dele se escusaram. Nos esclarece João Andrades de Carvalho que:

Assim como pode ocorrer o vácuo do pátrio poder, é possível também ocorrer o vácuo da tutela. Afastamento, impedimento ou inexistência de tutores testamentários ou legítimos são circunstancias que transferem para o juiz a incumbência de nomear tutor7.

Trata-se, portanto, de uma forma de tutela que apresenta caráter subsidiário, conferida pelo juiz à pessoa estranha, notoriamente idônea, quando se verificar a falta de tutor testamentário ou legítimo ou quando, existindo estes, forem escusados, excluídos ou removidos. O tutor dativo deve necessariamente residir no domicílio do menor - exigência esta que não se estende ao testamentário e ao legítimo – primeiro porque a lei assim determina; segundo porque é a pessoa incumbida de administrar os bens do menor, tarefa que dificilmente poderia exercer com o devido zêlo encontrando-se distante de tais bens. Porém, não existindo bens à serem administrados e não passando a tutela da proteção à pessoa do pupilo, nada impede que o encargo seja exercido onde melhor for para o tutelado. O estranho nomeado pelo juiz é obrigado a aceitar tal encargo e só poderá recusá-lo se houver um dos motivos de escusa previsto no artigo 414 do Código Civil ou, em concordância com o artigo 415 do mesmo Código, existir no local parente do menor que possa exercê-la.
Quanto aos menores abandonados ou carentes, estes terão seus tutores nomeados pelo juiz, ou poderão ser recolhidos a estabelecimentos públicos e, na ausência destes, ficarão sob os cuidados de voluntários que gratuitamente se encarregarão de sua criação, em conformidade com o artigo 412 do nosso Código Civil. Na definição de Bevilácqua, “por menores abandonados entende-se os expostos, aquelles cujos paes, incógnitos ou conhecidos, delles não curam, ou os deixam vagar, a mercê da caridade publica, e ainda aquelles cujos paes os levam a pratica de actos immoraes”8.

2.3) Regulamentação
Cuida o artigo 413 do nosso Código Civil dos considerados incapazes para o exercício da tutela. Tais causas legalmente amparadas encontram seu fundamento, quase sempre, em motivos que se revestem de relevantes valores morais. São considerados incapazes os que não se encontram na livre administração de seus bens (falidos, interditados, incapazes), os que se encontram constituídos em obrigação com o menor ou contra ele tenha que fazer valer seus direitos seus ou de seus ascendentes, descendentes ou cônjuge, os inimigos do menor ou de seus pais, os excluídos expressamente da tutela, os condenados por crime de roubo, furto, estelionato ou falsidade, independente de terem cumprido a respectiva pena, os ímprobos, os que abusaram de tutorias anteriores e os exercentes de função pública, sendo essencial nessa última hipótese que a natureza de seu cargo seja incondizente com a boa administração da tutela. A lei exige do tutor uma conduta irrepreensível, pois este exerce uma função que engloba a regência do menor e de seu patrimônio. Na lição de Orlando Gomes, “a exigência de idoneidade é de tal ordem que se confere por todo o tempo de exercício da tutela. Se for verificado que o tutor se encontra numa das situações que o tornaria incapaz para o exercício da tutela, deverá ser exonerado imediatamente”9. Assim, caso venha a se verificar que sobreveio ao tutor qualquer um dessas situações, deverá esse ser exonerado. Por se tratar de restrições de direito, o rol encontrado no artigo 413 é taxativo, e não pode, portanto, ser ampliado.
Embora trate-se de um múnus público, irrecusável, em alguns casos previsto no artigo 414 do Código Civil, poderá o obrigado se escusar da tutela. Tratam-se de motivos justos, que conferem ao nomeado o direito de se escusar, pouco importando sua espécie. Segundo o Código, são autorizados a escusarem-se do exercício da tutela: I as mulheres; II os maiores de 60 sessenta anos; III os que tiverem em seu poder mais de cinco filhos; IV os impossibilitados por enfermidade; V os que habitarem longe do lugar onde se haja de exercer a tutela; VI os que já exerceram tutela, ou curatela; VII os militares, em serviço. Quanto às mulheres, o direito de recusar a tutela é uma prerrogativa do sexo, sendo, portanto injustificável a possibilidade de recusa tendo por consideração apenas tal motivo, e, apesar da autorizadas legalmente, deveriam demostrar sua real impossibilidade em virtude de seus afazeres domésticos . Nessa linha de pensamento manifesta-se Bevilácqua:

A mulher não, coage a lei a que acceite a tutela. Julgando-a capaz desse officio, permitte-lhe , que por sua condição social, pela educação recebida [...] resolva, livremente, se se acha ou não em condições de consagrar as opulência e delicadezas de seu sentimento em beneficio do menor, cuja guarda se lhe oferece10.

As outras formas de escusas se justificam plenamente por também atenderem à interesses do menor. A escusa deverá ser apresentada nos 10 dias subsequentes à intimação do nomeado e, caso o motivo escusatório venha a ocorrer depois de aceita a tutela, nos 10 dias subsequentes ao seu surgimento. Em ambas as hipóteses, não sendo alegada dentro do prazo, presumir-se-á renunciado tacitamente o direito a renuncia (artigo 416). Não admitindo o juiz o motivo de escusa, o nomeado poderá interpor recurso (agravo de instrumento, previsto no artigo 842, VII do mesmo diploma legal), devendo exercer a tutela desde logo, enquanto aguarda a decisão recursal, sob pena de responder por eventuais perdas e danos que o menor venha a experimentar (artigo 417).
Para uma maior segurança dos interesses do menor, antes de assumir a tutela, o tutor é obrigado a especializar em hipoteca legal imóveis necessários para garantir sua gestão sobre os bens do menor que se encontram sob sua administração (artigo 418).

Caso o total de seu patrimônio seja insuficiente para tal garantia, deverá reforçar a hipoteca com caução real ou fidejussória, salvo se para tanto não disponha de meios ou seja de reconhecida idoneidade (artigo 419). O processo de especialização encontra-se disciplinado pelos artigos 1.205 ao 1.210 do Código de Processo.
Somente duas são as hipóteses em que a lei permite que seja o tutor dispensado de tais garantias: a primeira é quando o menor não possui patrimônio, porque nada existe para acautelar, hipótese em que a tutela se limitará somente a sua pessoa e, a segunda, quando o tutor é pessoa de notória integridade moral, o que leva a presunção de que a garantia do menor se encontra nessa reconhecida idoneidade. Note-se que a lei reforça tais garantias atribuindo ao juiz a responsabilidade solidária caso venha o menor a experimentar prejuízos, seja porque do tutor não exigiu as garantias legais, seja porque o mesmo encontrava-se em estado de insolvência quando de sua nomeação (artigo 420). De modo mais inteligível, esclarece Clóvis Bevilácqua que:

A lei impõe ao juiz a obrigação de nomear tutores ao menor, de examinar se o nomeado pelos ascendentes é capaz, de fiscalizar o exercício da tutela, de exigir garantias que acautelem o patrimônio do menor, de remover o tutor negligente, prevaricador, incapaz [...] Se o juiz é omisso no cumprimento desses deveres funccionaes, e o menor sofre prejuízos, por elles deve responder. A responsabilidade do juiz é subsidiária, isto é, far-se-á effetiva na falta ou insufficiencia do tutor11.


Porém, a responsabilidade do magistrado será pessoal e direta quando não houver nomeado tutor ou quando tal nomeação se mostrar importuna, respondendo assim, por todos os prejuízos experimentados pelo menor, que deverão ser por ele indenizados (artigo 421).
A fim de corrigir o menor, não pode o tutor aplicar-lhe castigos físicos, mesmo que moderado, pois tal faculdade é conferida apenas aos detentores do pátrio poder. Havendo necessidade de correção, deverá ele reclamar ao juiz, para que este, tome as medidas que julgar necessário (artigo 424, II).

Avesso a tal restrição se mostra Washington de Barros Monteiro ao afirmar que:

consubstancia a boa doutrina, que eles (os tutores) podem e devem corrigir os pupilos. São esses confiados pelo juiz aos seus cuidados, à sua proteção, ao seu amparo; corrigindo-os exercem direito inerente e essencial à autoridade de tutor. Só haverá abusos, excesso dos meios empregados, quando o castigo porventura recebido, cause dano ou prejuízo a saúde de quem o recebeu12.

Cabe aqui esclarecer que compartilhamos da opinião do ilustre mestre, desde que se trata de castigo moderado, como o autorizado aos pais no exercício do pátrio poder pelo pelo código Civil em seu artigo 394, § único, I e, com a finalidade de correção e não de punição.
Cabe ao tutor receber rendas e pensão do menor, administrar seus bens, os gastos necessários à sua subsistência e as quantias necessárias à sua educação bem como alienar os bens destinados a venda (artigo 426). Mesmo com autorização judicial não pode o tutor adquirir para si bens imóveis ou de raiz pertencentes ao menor; dispor de seus bens a título gratuito e constituir-se cessionário de crédito ou direito contra o menor, sob pena de nulidade (artigo 428). Os imóveis do menor só poderão se postos à venda quando houver manifesta vantagem, sendo tal venda realizada sempre em hasta pública e com autorização judicial, sob pena de nulidade (artigo 429). O tutor que, por culpa ou dolo causar prejuízo ao pupilo responde pelos prejuízos causados. A contrario sensu, tem o direito de ser ressarcido do que legalmente distender no exercício da tutela bem como o direito de perceber uma gratificação por seu trabalho (artigo 431) - salvo no caso do menor abandonado (artigo 412) – que, não tendo sido fixada pelos pais do menor, será arbitrada pelo juiz em até 10% no máximo da renda líquida anual dos bens administrados (artigo 413, § único). Tal remuneração só não será admitida quando se tratar de menor pobre ou sem recursos. Não se permite que o tutor conserve em seu poder mais dinheiro do que o necessário para os gastos com as despesas ordinárias de seu pupilo (artigo 432).
“A fim de que os tutores não especulem com o dinheiro de seus tutelados, a lei proíbe que o conservem em seu poder, além do necessário, para as despesas ordinárias com o seu sustento, a sua educação e a administração de seus bens”13.
O excedente a tais despesas deverá ser convertido em títulos da dívida pública da União ou dos Estados, depositando-se o quantum Na Caixa Econômica Federal, ou ser aplicado no aumento ou melhoria do patrimônio do menor, sempre mediante autorização judicial. Não existindo, na localidade, estabelecimento oficial, o Juiz determinará o depósito em qualquer estabelecimento bancário idôneo (artigo 666, I). Tal aplicação deverá ser imediata, respondendo o tutor pelos juros desde o dia em que deveriam ter aplicado o dinheiro recebido (artigo 432, § 2º). Os valores em depósito na Caixa Econômica Federal só poderão ser retirados, mediante ordem judicial, para despesas com educação e sustento do pupilo, compra de bens de raiz ou títulos da dívida pública ou para ser entregue ao menor, quando emancipado ao atingir a maioridade, sendo que, também é permitido o levantamento de tais valores em caso de falecimento do tutelado, com a finalidade de que sejam entregues a seus herdeiros (artigo 433, VI).
O tutor é obrigado a apresentar balanços anuais e a prestar contas em juízo a cada 02 anos (artigo 436). A prestação de contas é obrigatória mesmo que ao contrário tenham disposto os pais do menor (artigo 434) e, finda sua administração deverá submeter a autoridade judicial o balanço correspondente que, após aprovado, será anexado aos autos do inventário (artigo 435). O escopo de tais exigências é tornar efetiva a responsabilidade tutorial frente aos bens que lhe foram confiados. A obrigação de prestação de contas poderá ser exigida pelo juiz sempre que achar oportuno. Em caso de morte do tutor, a obrigação de prestar contas transmite-se aos seus herdeiro. Vindo a se tornar louco ou interdito, por qualquer motivo, tal responsabilidade caberá ao seu representante legal (artigo 438). Finda a tutela, com a maioridade ou emancipação do menor, ou, voltando este para a égide do pátrio poder, a quitação do tutelado somente surtirá efeito após a aprovação das contas pelo juiz (artigo 437), pois tal quitação se refere a atos praticados à época em que se encontrava sob o manto da incapacidade jurídica. O tutor tem o direito de ser reembolsado de todas as despesas justificadas, desde que prove terem sido revertidas em benefício do menor. As despesas com a prestação de contas, por serem de seu interesse, são de responsabilidade do menor (artigo 440) e envolvem as despesas com honorários advocaticios, custas e demais despesas judiciais realizadas pelo tutor.

Segundo Orlando Gomes:
A sentença pela qual o juiz julga as contas do tutor não dirime nem a actio tutellae directa nem a actio tutellae contraria. Assim, tanto o pupilo poderá acionar o tutor para haver perdas e danos como este a aquele para lhe cobrar o que lhe deve em razão da tutela14.


2.4) Da Cessação da Tutela

O Código Civil, em seus artigos 442 à 445 regulamenta as hipóteses de cessação da tutela, pois sendo medida de proteção temporária, destinada a proteger a pessoa do menor e, vindo este a se tornar capaz, por ter alcançado a maioridade ou sido emancipado ou, recaindo no pátrio poder, a tutela cessará automaticamente. Essas duas hipóteses, previstas no artigo 442, extingue a própria tutela, cessando, assim, a condição de pupilo, ora, por encontrar-se apto a reger seu próprio destino, capaz para todos os atos da vida civil, ora, por ser o pátrio poder incompatível com o exercício da tutela, cessando assim as atividades do tutor que são subsidiárias e instaurando-se a dos pais ou adotantes, que é primária. Já, nas hipóteses do artigo seguinte, o que vem a cessar é a condição do tutor, não se alterando a condição do incapaz. Ocorre com a expiração do prazo de 02 anos, pela escusa legítima ou pela remoção. O prazo de 02 anos, findo os quais o tutor estará desobrigado, encontra-se previsto no artigo 444 do Código Civil, e seu parágrafo único acrescenta que o tutor poderá ser reconduzido ao cargo se assim o quiser ou o juiz julgar tal recondução conveniente para o menor. O dispositivo em estudo é comentado por Clóvis Bevilácqua, segundo o qual “a tutoria é imposta, uniformemente, a todos os tutores, durante dois annos, sejam nomeados pelos paes, ou pelo juiz, ou chamados pela lei. No fim desse tempo, poderão continuar, se quiserem, e se o juiz tiver por conveniente ao menor”15.
Já a remoção de que trata o artigo 445 poderá ser decretada ex officio pelo juiz, a pedido do Ministério Público ou por qualquer interessado. A incapacidade de que trata esse artigo são as mesmas indicadas no artigo 413. Também será removido o tutor que infringir normas relativas a proteção do trabalho do menor, segundo disposição do artigo 437 e parágrafo único da Consolidação das Leis do Trabalho. Sendo removido um tutor, na mesma sentença será outro nomeado em seu lugar. O removido prestará suas contas e poderá sofrer processo criminal, se for o caso. Para Orlando Gomes “mesmo os tutores escolhidos pelos pais podem ser removidos, já que o interesse em seu afastamento, quando negligentes ou prevaricadores, não é apenas do pupilo, mas também da sociedade”16. As causas de remoção apontadas pelo Código não são taxativas e outras podem surgir que dêem ensejo a drástica medida. A destituição da tutela deverá ser decretada em procedimento contraditório nos casos acima apontados ou mediante a verificação de descumprimento dos deveres de guarda e educação que lhe foram incumbidos. A sentença que remover um tutor deverá nomear outro para dar seguimento ao instituto protetivo, até que ocorra um dos motivos previsto no artigo 442 e incisos do Código Civil.







1.1.1.1.1 3) DA GUARDA
O que se faz agora com as crianças é o que elas farão depois com a sociedade. (Karl Mannheim, sociólogo húngaro)


3.1) Noções Gerais

Atualmente a união entre homem e mulher, decorrente da sociedade conjugal de fato ou de direito, raramente é um compromisso duradouro, e, desfazendo-se os laços afetivos do casal, seja pelas sutilezas decorrentes das diferentes características da natureza humana, seja simplesmente pela extinção do afeto dos primeiros dias de convívio, tais desentendimentos se sobrepõem aos compromissos assumidos pelos que formaram a união e, desfazendo-se esta, com a existência de filhos decorrentes de tal relação, surge a indubitável questão: quem ficará com os filhos menores? Diante desse fato, dentre outros, é que surge o problema da guarda, conceituada por José Antônio de Paula Santos Neto como:

o direito consistente na pose do menor oponível à terceiros e que acarreta dever de vigilância e ampla assistência a este [...] o conjunto de relações jurídicas que existem entre uma pessoa e o menor , dimanados do fato de estar este sob o poder ou companhia daquela, e da responsabilidade daquela em relação a este, quanto a vigilância, educação e direção17.

O vínculo jurídico existente entre o menor e seus genitores é regulamentado por leis, que especificam os direitos e deveres de ambos, sendo que, predomina o direito dos filhos, independentemente da união da qual estes resultaram.

Sob este prisma pode-se afirmar que a guarda é um poder-dever, regulado por um regime jurídico, visando facilitar à pessoa qualificada para tanto o exercício do amparo e proteção daquele considerado por lei como carente de tais medidas.
Sendo assim, pode-se concluir que a guarda, como os demais institutos que visam a proteção do menor, não só é um poder pela similitude que contém com a autoridade parental, mas também é um dever, pois decorre de impositivos legais com natureza de ordem pública, razão pela qual se pode conceber seu exercício como um poder-dever.




Esse ponto de vista é esclarecida da seguinte forma por Waldyr Grisard Filho, que define a guarda como:

[...] locução indicativa, seja do direito ou do dever, que compete aos pais ou a um dos cônjuges, de ter em sua companhia os filhos ou de protegê-los, nas diversas circunstâncias indicadas na lei civil. E guarda, neste sentido, tanto significa custódia como a proteção que é devida aos filhos pelos pais18.

Em sentido jurídico, guarda seria o efeito de guardar, manter em vigilância e custódia, representar o filho enquanto impúbere ou assisti-lo, quando púbere. A guarda é inerente ao pátrio poder e, enquanto na constância da união, é compartilhada por ambos genitores. Ocorrendo a separação, quem perde a guarda não perde o pátrio poder, mas apenas o exercício efetivo daquela, enquanto que, o direito do cônjuge não guardião permanece latente, conservando assim seu direito de manutenção e fiscalização dos filhos e o direito de visitas, garantido pelo artigo 15 da Lei nº 6.515/77 (Lei do Divórcio). Daí se conclui ser possível a existência do pátrio poder sem a guarda, que nesse caso passará a constituir direito distinto e autônomo de outra pessoa. Segundo a opinião de J. Franklin Alves Felipe:

No direito brasileiro a guarda de menores pode advir de duas situações distintas e sujeitas a diferentes disciplinas jurídicas: A guarda de menores em decorrência da separação de fato ou de direito entre os pais e a de menores de que trata o Estatuto da Criança e do Adolescente. Em ambos os casos, contudo, permanece o conceito de guarda. Assim, nos casos de separação judicial, um dos cônjuges perde a guarda do filho, mas permanece detentor do pátrio poder. Também, por outro lado, quem detém a guarda de um menor desasistido nem por isso se investe das faculdades inerentes ao pátrio poder19.

3.2) Formas de Constituição da Guarda

A guarda de filhos menores é parte fundamental do pátrio poder pois representa o direito do menor de ser criado no seio de sua família natural ou adotiva.
Tal espécie de guarda, denominada de guarda comum ou legitima é um direito próprio, inerente do menor, auferido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90).
Na lição de João Andrade de Carvalho, “a guarda decorre do pátrio poder, é gerada por ele, nasce de sua constituição. Mas tem natureza própria: a necessidade de proteção que nasce com o ser humano20.

Diz-se delegada a figura da guarda que surge com o fim da sociedade conjugal, podendo ser confiada a um dos pais através de acordo ou por decisão judicial, segundo o melhor interesse do menor. A interferência do judiciário, quando necessária, dispõe, geralmente, sobre o que mais adequada julgar aos interesses do menor. Essa modalidade só pode existir na vigência do pátrio poder e encontra-se regulamentada pelo Código Civil, obedecendo as regras do Direito de Família. A homologação ocorre na guarda fixada através de entendimento dos pais, em ações de separação judicial consensual, onde o mútuo acordo prevalece, ou em casos em que, mesmo sendo litigiosa a separação, não haja resistência entre os cônjuges quanto a mesma. É o que o artigo 9º, da mencionada lei 6.515/77 - anteriormente citada - nos transmite. A homologação só é negada, quando o juiz entender que o interesse do menor se encontra agredido no acordo firmado pelos pais. Waldyr Grisard Filho, assim se expressa:

O processo formativo dos filhos requer a concorrência de ambos os genitores. Na constância do casamento o pátrio poder, e nele a guarda, concentra-se na pessoa dos pais, conforme artigos 380 do CC e 21 do ECA. O mesmo se dá na união estável pelo que dispõe o artigo 2º, da Lei 9.278/96. Com a separação, garantem os artigos 381 do CC e 27 da LDiv., que nenhum dos pais perde o pátrio poder relativamente aos filhos menores, mas a guarda dissocia-se, debilitando-o. Por certo, a separação dissolve a sociedade conjugal, porém não a parental entre pais e filhos, cujos laços de afeto, direitos e deveres recíprocos subsistem, apenas modificados quando necessário para atender-se à separação dos cônjuges21.


Caso não haja acordo entre os genitores, a guarda é decidida pelo juiz, o qual procura amparar o bem estar e interesse do menor.

Inexistindo os pais ou estando estes destituídos do pátrio poder, temos a figura da guarda outorgada, sendo que, essa modalidade surge unicamente por decisão judicial e se encontra regulamentada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu artigo 28 e ss..

Os princípios legais que envolvem a guarda de filhos são aplicáveis não apenas às ações de separação judicial mas, também, às ações de dissolução de sociedade de fato, pois se manifestam ao pátrio poder e não ao vínculo conjugal.


3.3) A Guarda na Separação de Fato

Ocorrendo a discórdia entre o casal e tornando-se impossível a convivência em comum, quase sempre se torna inevitável a separação de fato, como um primeiro estágio a anteceder a separação judicial e o divórcio. Nesse caso, complexa questão surge, pois não se tendo examinado a culpa e não se sabendo com quem será mais conveniente para o menor permanecer, a quem caberá a guarda deste? Discorrendo sobre o assunto J. Franklin, nos apresenta a seguinte opinião:

A tendência jurisprudêncial que se observa nessas situações é manter o status quo ante, até que por intermédio do processo de desquite, se apurem as culpas e se decida, definidamente, a quem cabe o direito de quarda. [...] Assim, se o menor está sob a quarda de fato de um dos cônjuges, convém deferir-lhe provisoriamente a posse legal, enquanto pende a ação de separação22.

Tal situação se apresenta bastante razoável, pois ocorrendo a separação de fato nada mais justo que o menor permaneça com o cônjuge com o qual se encontrava, até que venha uma decisão final, pois a princípio ambos os pais tem direito a guarda do filho. Tais regras são as mesmas a serem seguidas no caso de dissolução do concubinato, diferenciando apenas quanto ao critério da culpa, que somente é valido para os filhos havidos na constância do casamento.

Já em face ao novo sistema constitucional, além dos princípios de igualdade jurídica dos cônjuges e dos filhos, prestigia-se também como entidade familiar a União Estável (art. 226, § 3º CF). A família, pelo entendimento do referido artigo Constitucional, não se constitui apenas pelo casamento, mas também pela união estável entre um homem e uma mulher, devendo o Estado assegurar proteção e assistência a cada uma das pessoa que a integra. Atentando para a proteção do melhor interesse dos menores, a jurisprudência, nesses casos, tem se inclinado maciçamente para a aplicação analógica artigo 10, da Lei 6.515/77 nos casos de dissolução da sociedade conjugal de fato.

3.4) A Guarda na Separação Consensual

Ocorrendo a separação consensual, convencionam os cônjuges segundo melhor lhes aprouver, no que diz respeito à guarda e a visitação dos filhos, porém, poderá o magistrado recusar-se a homologar o acordo, amparado pelo artigo 34, § 2º da lei 6.515/77 (Lei do Divórcio), delegando a guarda a um dos genitores ou até mesmo a terceiros, caso seja mais conveniente aos interesses e ao bem estar do menor. Nesse sentido se faz oportuna a lição de Marcos Aurélio S. Viena, segundo o qual:

O poder de apreciação do juiz é significativo, mas não deve ser confundido com arbítrio. Cumpre-lhe explicar as razões pelas quais seu entendimento se definiu em outro sentido, alterando as regras enunciadas em lei. Ele não está adstrito a solução legal, podendo regular a guarda de forma diversa, mas indicará os motivos que o levaram a esse caminho, que deverão ser efetivamente graves23.

Essa intervenção do juiz deve ser utilizada somente em casos excepcionais, pois presume-se que sejam os pais os maiores interessado no bem estar do menor.

3.5 ) A Guarda na Separação Contenciosa

Na separação judicial contenciosa, segundo dispõe o artigo 10 da Lei do Divórcio, deverão permanecer os filhos com o cônjuge inocente. Tratando-se de crianças de pouca idade a tendência jurisprudêncial é de que estes permaneçam com a mãe, que é a mais indicada para oferecer o afeto, carinho e os cuidados de que a criança necessita em seus primeiros meses de vida. Poderá também o magistrado, caso constate ser inconveniente de que os filhos permaneçam com os pais, por estes não se mostrarem aptos à formá-los e educá-los, amparado pela lei, delegar a guarda a terceira pessoa, de idoneidade notória, pertencente, via de regra á família de um dos cônjuges.

Na indicação de qual parente, como não incluso no citado artigo, o juiz pode, por analogia, utilizar o artigo 409, do Código Civil, combinado com a Constituição Federal, quanto a igualdade entre o homem e a mulher.

O parágrafo 1º do artigo 10, da Lei 6.515/77, estipula: “os filhos menores ficarão em poder da mãe”. A norma em questão contém a presunção de que é mais adequado ao menor a convivência com a mãe.
Em relação a esta preferência, que não leva em consideração a igualdade entre o homem e a mulher, contestações de doutrinadores tem ocorrido, embora a mesma ainda predomine.

A guarda de filhos, para que amparo legal contenha, deve ter sido homologada ou conseguida através de sentença judicial. Quando a definição da guarda decorrer de separação judicial litigiosa, amparada em atitude culposa de uma das partes, não deve ser atribuída a guarda ao cônjuge culpado pelo não cumprimento dos deveres constantes no artigo 231, do Código Civil. Atualmente a rigidez deste artigo se encontra minimizada, em favor dos interesses do menor.
Em regra geral, a guarda é dada a quem não der causa à anulação, ocorrendo de forma diferente se o bem estar do menor assim o exigir.


3.6 ) A Guarda no Estatuto da Criança e do Adolescente

No Estatuto da Criança e do adolescente (Lei 8.069/90), a guarda figura como maneira provisória de colocação do menor em lar substituto, visando posterior adoção. Tem como finalidade primordial colocar em uma família aqueles menores que não tem condições de serem criados e educados em seu lar natural. Opinando sobre o assunto, Karen Ribeiro Pacheco Nioac Salles nos expõe a seguinte ensinamento:

O Estatuto da Criança e do adolescente dispõe, em seu artigo 19, ser direito fundamental da criança e do adolescente viver, ser criado e educado no seio de sua família natural e, por exceção, quando esgotados todos os meios de manutenção na família, ser colocado em família substituta, assegurando a convivência familiar e comunitária [...] a guarda é a forma provisória de colocação do menor em família substituta, com fito de posterior adoção. Porém, apenas a guarda desprovida deste instituto, poderá ser concedida em caráter excepcional. Atinge as crianças e adolescentes que, por abandono dos pais ou orfandade tem essa necessidade24.


Embora provisória, pode durar toda menoridade, sendo que, o menor, ao atingir 18 anos sem que a guarda tenha sido convertida em adoção, perderá todos os vínculos com os seus detentores por extinção daquela, sendo esse o principal motivo da provisoriedade da medida, que não deverá, sempre que possível, ser prorrogada indefinidamente no tempo.
Porém, apesar do fato de se tratar de medida provisória, não quer dizer que não gere direito ao seu detentor. Ao contrário, destacando-se do pátrio poder, permanecem os genitores com o poder de representação do menor, porém, o detentor da guarda tem o direito legítimo de ter o menor em sua companhia, podendo opor-se para tanto, inclusive aos pais biológicos, sendo que, nesse sentido se mostra claro o caput do artigo 33 do estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90), que confere ao detentor da guarda o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais, se necessário for.

O descrito nos demonstra que, em qualquer modalidade de guarda de filhos menores, os princípios que devem ser considerados para análise da causa e tomada de decisão em relação à mesma, aplicam-se da mesma forma a todos os menores, independente do tipo de relação existente entre seus pais. O que ampara a guarda do menor, quando a causa for originada por irregularidade, será o Estatuto da Criança e do Adolescente, como já analisado. Se a causa decorrer de uma separação dos genitores, quando os laços afetivos do casal se rompem, gerando a problemática da guarda dos filhos, os princípios legais que devem ser observados são os da Lei do Divórcio ( Lei 6.515/77).


3.7) Guarda Provisória e Guarda Definitiva

A guarda provisória, também chamada de temporária é a que surge na pendência dos processos de separação judicial ou de divórcio, quando o menor é confiado a um só dos pais sob o regime de guarda única. Trata-se de medida provisória, enquanto se aguarda a solução da demanda que se dará com a sentença, que homologa ou decreta o fim da sociedade conjugal, tornando-se definitiva após criterioso exame do magistrado a fim de atribuir a guarda ao genitor mais apto a atender as necessidades do menor.

Nesse sentido, José de Farias Tavares expõe:

A guarda poderá ser provisória quando concedida por antecipação, como medida liminar, em procedimento de tutela (arts. 36 a 38) ou de adoção (arts. 39 a 52), ou face à urgência, durante o curso procedimental – é o que determina o § 1º do artigo 33 do ECA25.


Quanto à guarda definitiva, o termo “definitivo” apresenta-se impróprio, pois sendo a finalidade primordial da guarda satisfazer o interesse do menor, de acordo com as circunstâncias que envolvem seu desenvolvimento, esta poderá ser modificada a qualquer tempo, mediante ato fundamentado do juiz, por disposição dos artigos 35 e 149, § único do ECA (Lei 8.069/90). O que ocorre é que, a concessão da guarda a um dos genitores, não faz coisa julgada, prevalecendo nesse caso a cláusula rebus sic standibus , ou seja, a sentença será imutável enquanto a situação fática permanecer a mesma, afastando assim a regra do artigo 471 do CPC. Dessa forma, sobrevindo modificação no estado de fato ou de direito do detentor da guarda, poderá o juiz rever a causa a qualquer tempo.


3.8) Revogação, Perda, Modificação e Extinção da guarda

Como já visto anteriormente, não possui a guarda caráter definitivo. O artigo 35 do ECA (Lei 8.069/90), declara que esta poderá ser revogada, a qualquer tempo, mediante ato fundamentado do juiz, quando esta resultar inconvenientes aos interesses do menor, desde que em procedimento regular e com parecer do Ministério Público perante o mesmo juízo que deferiu a medida. Já, no que diz respeito à perda ou modificação da guarda, oportuna se faz o ensinamento de Marco Aurélio S. Viena, que assim se expressa:

O parágrafo único do artigo 169 reza que a perda ou modificação da guarda poderá ser decretada nos mesmos autos em que se discute a respeito da destituição da tutela, perda ou suspensão do pátrio poder, nas hipóteses em que aquelas medidas constituem pressuposto lógico da medida principal de colocação em família substituta26.



De tal lição se extrai facilmente a conclusão de que a perda ou modificação da guarda poderá ser decretada pelos mesmos motivos de destituição da tutela, perda ou suspensão do pátrio poder.

Quanto a extinção, esta ocorre nas seguintes hipóteses: a) com a falecimento dos genitores; b) no ECA (Lei 8.069/90), ao completar o menor 18 anos; c) na emancipação; d) sendo retomado o pátrio poder, e) por ato judicial fundamentado com parecer do representante do Ministério Público; f) por modificação, quando é transferida para o genitor que não a detinha para si.


3.9) A Guarda e o Direito Previdenciário

Deferindo o juiz a guarda de um menor, o mesmo se encontra apto a gozar os benefícios previdenciários de seu guardião, dependendo apenas de declaração expressa do segurado. Feita tal declaração, segundo disposto no artigo 16, § 2º da Lei 8.213/91 (Lei Benefícios da Previdência Social), o menor passa a ser comparado, para efeitos previdenciários, como filho do segurado. O Eca (Lei 8.069/90), não exige qualquer manifestação do segurado para que o menor sob sua guarda seja declarado seu dependente, pois em seu artigo 33, § 3º declara expressamente que a guarda confere ao menor a condição de dependente para todos os fins, inclusive previdenciários. Nesse sentido oportuna se faz a lição de Karen Pachecheco Nioac de Salles, segundo a qual,

O ECA autoriza expressamente [...] a guarda para estes fins. Outro argumento de extrema valia é que o ECA deve ser interpretado à luz dos fins sociais para o qual são dirigidos suas leis e em função da condição peculiar do menor em desenvolvimento27.


3.10) A Guarda e o Direito de Visitas

A expressão “direito de visitas” não deixa de ter oposição de alguns doutrinadores, os quais entendem que na realidade é um “dever dos pais” e um “direito dos filhos à companhia dos mesmos”. Tanto faz que a expressão usada seja dever ou direito, o que importa é que é fundamental, ao genitor que não detém a guarda, para que possa acompanhar o desenvolvimento do filho e, ao filho, para que possa manter contato com ambos os pais, apesar de muitas vezes o direito ser utilizado pelos pais como agressão mútua, como por exemplo, quando o guardião dificulta as visitas ou o não guardião retarda a restituição do filho.

O direito de visitas é inalienável e impostergável, não podendo ser negado, mesmo ao pai criminalmente condenado. O exercício pode ser suspendido, não o direito, se circunstâncias o exigirem. Existem também pais que não fazem uso do direito de visita e, quando isso ocorre, não existe amparo jurídico para que os mesmos sejam obrigadas a exercê-lo. Quem exerce a guarda não se reveste de amparo legal para obrigar a visita o genitor não guardião.
Porém, caso seja determinado os dias de visita, a mãe não poderá se opor. Isso sim, torna-se uma obrigação: aceitar e seguir o que foi determinado judicialmente.
O que deve ficar claro é que o direito de visitas não pode e não deve ser confundido com a guarda, pois o mesmo é o poder/dever, dos que não apenas podem, mas devem ter acesso aos filhos, netos, em cuja companhia não residem.

O mesmo se dá na união estável pelo que dispõe o artigo 2º, da Lei 9.278/96. Com a separação, garantem os artigos 381 do CC e 27 da LDiv., que nenhum dos pais perde o pátrio poder relativamente aos filhos menores, mas a guarda dissocia-se, debilitando-o. Por certo, a separação dissolve a sociedade conjugal, porém não a parental entre pais e filhos, cujos laços de afeto, direitos e deveres recíprocos subsistem, apenas modificados quando necessário para se atender à separação dos cônjuges.
Na dissolução da sociedade conjugal, já se define a guarda dos filhos, a qual fica respeitada na conversão em divórcio, a não ser que o juiz entenda que está a prejudicar o menor.

Enquanto a ruptura não ocorrer a família unida não tira dos filhos a convivência com seus pais. Ocorrendo, surge a família monoparental e a autoridade dos pais, até então exercida em conjunto, passa a se concentrar, em regra, em um só, reduzindo o outro a um papel secundário.




Sobre o assunto, Arnaldo Rizzardo assim se manifesta:

Atualmente os pais consideram-se no mesmo grau de igualdade em todas as questões relativas ao casamento e à união estável, no que pertine aos filhos. É indispensável saberem separar questões pessoais daquelas que envolvem a prole. No caso de separação, os filhos ficam na guarda de um e ao outro é reservado direito de visitas. Mas não há perda, nem sequer do exercício do pátrio poder. Deve sempre haver concordância entre os progenitores quando houver filhos envolvidos. A separação dissolve a sociedade conjugal, mas não a parental28.

Os casos que envolvem a guarda de filhos, geralmente afetam o psico-emocional do menor, o que não deixa de criar uma tarefa árida, difícil, quando decisão sobre a mesma necessita ser tomada judicialmente, por falta de acordo entre os pais. A aplicação, de maneira rígida, das normas jurídicas existentes, muitas vezes, desconsidera ou reprime o aspecto emotivo, provocando canalização de agressividade e gerando uma escolha a qual não deixa de ser uma renúncia aos próprios direitos.
A jurisprudência, em relação ao direito de visita, considera os avós incluídos no mesmo, os quais podem inclusive postular juridicamente a respeito.

3.11) Modalidades de Guarda

A modalidade denominada GUARDA COMUM é a que ocorre na constância do casamento, onde seu exercício é desenvolvido conjuntamente por ambos genitores. Consiste na convivência familiar, que é pressuposto essencial para a educação, formação e bem-estar do menor. Segundo Waldir Grisard Filho, “a guarda integrada assim ao pátrio poder não corresponde aos pais por concessão do Estado ou da lei, senão preexiste ao ordenamento positivo, que apenas a regula para o seu correto exercício”29. Sua origem não provem da lei, mas da paternidade e da maternidade, ocupando o lugar do direito de guarda na impossibilidade de seu exercício conjunto.

A modalidade GUARDA ORIGINÁRIA é aquela que compete aos pais como mencionado acima, integrante do pátrio poder, possibilitando o desenvolvimento pleno de todas as funções parentais.

A modalidade GUARDA ÚNICA é a exclusiva de um só dos genitores, que detém a “Guarda Física”. É a de quem possui a proximidade diária do filho e a “Guarda Jurídica”, dirigindo e decidindo assim as questões que envolvem o menor.
A modalidade GUARDA DERIVADA é a que se impõe por força da lei, representada pela tutela em qualquer uma de suas formas, segundo os artigos 407, 409 e 410 do Código Civil ou pelo Estado no desempenho de sua função social, de acordo com o artigo 30 do ECA (Lei 8.069/90).

A modalidade GUARDA DE FATO é a que ocorre quando uma pessoa, sem qualquer atribuição legal ou judicial, movida por sentimentos altruístas, toma o menor aos seus cuidados, não tendo sobre ele nenhum direito de autoridade, porém, todas as obrigações inerentes a guarda, como assistência e educação. A guarda pode ser solicitado por qualquer pessoa, desde que motivos graves sejam comprovados, pois sempre é o interesse do menor que se sobrepõe. Na maioria dos casos, estando uma pessoa de posse fática do menor já por longo tempo, é aplicado analogicamente o contido na LDvi (6.515/77), artigo 11.
A modalidade de GUARDA ALTERNADA, que eventualmente ocorre, é a em que, cada genitor detém a guarda do filho segundo um esquema preestabelecido, através de um sistema de alternância do período com que o menor mora com cada um dos pais, podendo dividir-se em dias, semanas, meses, anos, etc.. Para Waldyr Grisad Filho “Essa modalidade de guarda opõe-se fortemente ao princípio de continuidade, que deve ser respeitado quando desejamos o bem-estar físico e mental da criança”30. Alem do mais, essa modalidade apresenta mais desvantagens do que vantagens a medida que, o nível de interesse pessoal da criança poderá ser prejudicado com a possibilidade de desestruturação de sua personalidade em decorrência dos conflitos criados pelos pais. “A guarda alternada não deixa de ser uma guarda única, apenas se verificando uma alternâcia das posições dos genitores”31.

Existe também a modalidade GUARDA DIVIDIDA, sob a qual Oliveira Leite, assim se expressa: “A guarda dividida se impôs como o recurso de exercício de autoridade parental mais propícia a criança, já que ela viverá em um “lar” determinado e usufruirá da presença do outro genitor, a quem não foi atribuída a guarda, através do direito de visitas”32. Atualmente essa modalidade tem encontrado forte resistência por parte de alguns pais que “não mais admitem assumir um papel secundário na vida dos filhos e buscam forma para inverter a situação, de modo a garantir uma participação mais efetiva na vida de seus filhos”33.
Na modalidade ANINHAMENTO ou NIDAÇÃO, são os pais que se revezam, mudando-se para a casa onde vivem os menores, em períodos alternados de tempo. Tal sistema é praticamente fictício, pois exigiria a manutenção de três residências, sendo uma para o pai, uma para a mãe e outra onde viveriam os menores.

A GUARDA COMPARTILHADA, também chamada por alguns de GUARDA CONJUNTA, na maioria das vezes, sequer é mencionada. Sobre a mesma, o próximo capítulo do presente trabalho, tem por objetivo, uma análise detalhada.

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