PENSÃO - 30% NÃO É REGRA!
Na grande maioria das vezes que sou procurado por alguém que deseja ingressar com uma ação de alimentos, seja por mães que buscam pensão para seus filhos menores, ou mesmo por alguns pais mais zelosos que ofertam espontaneamente auxílio material à prole, e, depois de indagar quanto se pretende ofertar ou receber, deparo-me quase sempre com a mesma resposta, que acaba vindo em forma de outra pergunta: "Ora, doutor, o valor não é 30%?". Não! Respondo de pronto, de forma até instintiva. Resposta que é sempre motivo de espanto. Sinceramente, desconheço a origem desse mito sobre a fixação dos alimentos, que faz com que as pessoas acreditem numa regra preestabelecida para arbitramento no percentual de 30% dos rendimentos da pessoa obrigada ao pagamento. Por absoluta curiosidade, empreendi algumas pesquisas na internet, mas não encontrei a origem dessa crendice popular, que, acredito, já deve ter sido ouvida por todos os colegas que militam no direito de família e por aqueles que, ocasionalmente, tiveram a oportunidade de patrocinar uma ação de alimentos.
Penso que essa fantasiosa ideia de que a pensão alimentícia deva sempre corresponder a 30% dos ganhos possa ter surgido da recorrência do percentual em alguma localidade, como resultado, talvez, da comodidade de alguns juízes de Varas de Família, que, sem vocação para lidar com o tema, utilizavam indistintamente esse percentual para se livrar dos processos de alimentos, sem, contudo, examinar as condições pessoais e particularidades de cada caso. Entretanto, a prática da fixação indistinta constitui minoria no Poder Judiciário, pois geralmente as peculiaridades de cada caso são sempre analisadas em razão do elevado número de processos e reduzido número de juízes. Ademais, nosso sistema jurídico permite que as partes desafiem as decisões dos juízes monocráticos, mediante a interposição de recursos a uma instância superior, onde o caso tornará a ser analisado.
O certo é que não há uma regra fixa e objetiva para o arbitramento dos alimentos. Como se diz no jargão forense, não há "receita de bolo" para essa fixação. O parâmetro legal para a quantificação dos alimentos, desde o revogado Código Civil de 1916, tem sido a obediência ao binômio da necessidade versus possibilidade. Ou seja, os alimentos devem ser fixados de forma que atendam às necessidades daquele que os reclama, mas que ao mesmo tempo estejam dentro das possibilidades financeiras daquele que vai suportá-los. Atualmente, boa parte da doutrina do direito de família já fala na fixação dos alimentos de acordo com o trinômio da necessidade versus possibilidade versus proporcionalidade, de modo que, além das necessidades e possibilidades, também seja considerada a proporcionalidade na fixação para assegurar que o valor determinado pelo juiz seja suficiente à garantia da dignidade do alimentando, sem, contudo, permitir seu enriquecimento sem causa. O que de fato deve ser levado em conta para estimar o valor dos alimentos são as necessidades do alimentando com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer etc. e as possibilidades da pessoa obrigada ao pagamento. Assim, deverá haver equidade na fixação dos alimentos de forma que o valor das necessidades do alimentando esteja equalizado com as possibilidades financeiras do alimentante.
Podem ocorrer casos em que o valor necessário à manutenção dos filhos corresponda apenas a 5% ou 10% dos rendimentos do genitor obrigado ao pagamento, ou, ainda, que a necessidade seja superior a 50%, valendo lembrar que nem sempre há como mensurar os rendimentos do alimentante, como ocorre no caso de profissionais liberais, empresários e comerciantes. Nessas hipóteses, os alimentos costumam ser fixados em valor preciso, mediante a estipulação de um índice de reajuste mensal ou anual, pois a lei expressamente o exige. Normalmente, o índice escolhido pelos magistrados costuma ser o salário mínimo fixado pelo governo federal, já que seus reajustes acompanham o aumento dos preços dos produtos e serviços, além de facilitar a liquidação dos cálculos nos casos de execução. Por fim, vale a lembrança de que a responsabilidade pela criação e sustento dos filhos é de ambos os genitores, segundo a Constituição Federal, pelo que, em regra, as despesas dos filhos devem ser rateadas entre pai e mãe, não podendo recair somente sobre os ombros de um deles.
Silvio Tarabal Coutinho é Advogado, vice-presidente do IBDFAM/MG