EM DEFESA DE UM NOVO MODELO DE CONVIVÊNCIA COM OS FILHOS
Num grande avanço jurídico, na década de 70, foi editada a Lei do Divórcio.
Mas a grande revolução se manteve fiel à sistemática do vetusto Código Civil brasileiro de 1916, o da responsabilidade civil para os casos de dissolução do vínculo conjugal. Esta responsabilidade tinha natureza subjetiva, fundada na teoria da culpa. Em outras palavras, o casal poderia obter o Divórcio, mas haveria um cônjuge “culpado” e outro “inocente”.
Na relação com os filhos, algo muito similar ocorreria, os filhos, salvo condições específicas, passariam a residir com o “inocente” e ao causador da mácula social, o divórcio, caberia direitos mínimos em relação aos filhos e o dever de prover a alimentação.
Passaram-se décadas e, na novel Constituição, promulgada em outubro/1988, consagrou-se o princípio da igualdade entre os gêneros, entre mulheres e homens. Mais à frente, em 2002, o já superado Código Civil brasileiro de 1916 foi alterado sensivelmente e, atualmente, na separação do casal, juridicamente, não há mais distribuição da culpa entre os cônjuges, pois esta não é buscada na instrução do feito.
Quanto às questões envolvendo os filhos, embora haja sensível modificação legislativa, ainda há, a meu sentir, longo caminho a ser trilhado.
O Pai continua a ser visto como mero provedor, pessoa hábil apenas em propiciar aos filhos condição financeira para sua manutenção e, eventualmente, visitar os filhos a cada período delimitado de tempo.
A guarda compartilhada é um avanço, sem dúvida alguma, pois permite a participação de ambos os pais no cuidado com os filhos, mas defendo de forma veemente, a guarda alternada como melhor condição para os filhos e para os pais separados.
O principal argumento a ser utilizado para estas situações é a constante mudança de residências das crianças, bem como das orientações e rotinas às quais estariam submetidas. Não vejo dessa forma, com o devido respeito.
Psicologicamente, é melhor para as crianças terem contato com o Pai e a Mãe, com o “masculino e o feminino”, do que terem contato apenas com um ou com o outro, durante a maior parte do tempo.
Se as crianças estudam, convivem na casa dos avôs, de colegas ou de outros locais, resta evidente que há normas e estruturas diferentes em cada um destes lugares. No convívio doméstico, muitas vezes, as crianças estão nas mãos de cuidadores e a rotina das crianças é constantemente alterada, sem que haja perda significativa da qualidade de vida das mesmas em todas as situações.
Parece-me, também, ser evidente que os pais, no sentido de educar seus filhos, estabeleçam limites ou um mínimo de prioridades (cursos, aulas, remédios, etc.) e não uma situação absolutamente contrária um ao outro. Os dois pais, obviamente, têm interesse na educação e criação dos filhos da melhor maneira possível. Divergência sempre haverá, mas essa é, exatamente, uma característica do próprio ser humano. Dentro do próprio casamento, sempre um dos cônjuges é mais rigoroso do que o outro, um é mais carinhoso do que o outro, um é mais preocupado do que o outro. Ressaltar diferenças para buscar a separação dos filhos de seus pais é algo monstruoso.
No interesse da criança, é melhor que a mesma tenha, efetivamente, dois lares, duas casas, a do Pai e da Mãe, do que um lar capenga, apoiado apenas numa única faceta da relação pai/mãe.
Há muitos casais que já vivem essa situação, ou seja, o Pai ou a Mãe passam a maior parte do tempo fora de casa e quando retornam, já há uma modificação no relacionamento entre filhos e pai/mãe e não vejo os defensores de tese contrária combater tal situação.
Ora, se hoje temos uma situação nova, não se pode manter a jurisprudência enraizada num modelo arcaico de núcleo familiar, de convivência uniparental, quando há, efetivamente, novo modelo. Privar um dos Pais de toda a responsabilidade e da convivência com seus filhos é errado, pois foi rompida a relação de marido e mulher e não a relação entre Pai, Mãe e filhos...
É muito mais interessante para os filhos a convivência com seus pais, observando suas diferenças do que conviver com eternas questões entre os ex-cônjuges. Para os Pais, também, é melhor conhecer, conviver e respeitar as diferenças com seus filhos do que apenas “visitar” seus filhos. Quem realiza visitas são os parentes, os amigos e não deve ser uma característica do Pai ou da Mãe.
Financeiramente também, me parece ser mais lógica a convivência alternada do que a uniparental ou mesmo a compartilhada típica. As crianças crescem num limite das possibilidades econômicas de cada um e não numa redoma artificialmente criada com um falso propósito de protegê-las, pois não dá às crianças a visão da participação individual de cada um de seus pais na sua criação. Dá a ilusão de que tudo que fazem ou possuem é oriundo do guardião, o que não é absolutamente verdade.
A criança não deixa de ter um Pai e uma Mãe após a separação do casal, mas a jurisprudência trata o assunto como se ainda estivéssemos vivendo no passado. A maioria dos julgados simplesmente presume que é melhor para a criança permanecer na convivência da mãe, imaginando que esta ainda passa a maior parte do dia em casa, o que não é verdade. Fico assistindo em algumas audiências por mim presididas a quantidade de mães que trabalham o dia inteiro e delegam o cuidado com os filhos a terceiros, nem sempre bem qualificados para cuidar das crianças.
Qualquer regime de visitas que não estabeleça igualdade de condições ou tempo na convivência entre pais e filhos é inconstitucional, já que privilegia um dos pais em detrimento do outro.
Pode ser considerada a convivência dos filhos, com seus pais, no sentido da nidação, mas não são todos os casais que possuem condições emocionais ou econômicas para manter ou sustentar tal condição, por isso, a guarda alternada é a mais adequada ao novo modelo de família que surge após o rompimento da relação pai/mãe.
Finalmente, hoje temos uma mudança drástica de toda a estrutura familiar, já temos famílias constituídas por dois pais ou duas mães, filhos por inseminação artificial, filhos adotivos, famílias constituídas de diversos irmãos ou irmãs de pais diferentes e não vejo a razão de não se adotar uma postura mais avançada em relação à guarda dos filhos.
Noto que homens e mulheres, hoje, em igualdades de condições, são capazes de gerenciar grandes empresas, grandes grupos de pessoas, altas responsabilidades. Contudo, em relação a seus filhos, são tratados como se estivéssemos num remoto passado.
Daniel Gomide Souza, Juiz Federal Substituto do Trabalho de Minas Gerais.