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COM QUEM DEVO FICAR? - DANOS PSICOLÓGICOS DA DISPUTA DE GUARDA EM CRIANÇAS

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Na contemporaneidade, têm sido fonte de alerta para todos os profissionais que trabalham com casais em processo de separação a Síndrome de Alienação Parental (SAP), que segundo Gardner (in Silva, 2009), é um processo onde um dos genitores “programa” a criança para odiar o outro. O genitor guardião, sem nenhuma justificativa, incentiva a criança a não gostar do outro genitor, denigre sua imagem, acusa-o sem que esteja junto para se defender, até que a criança passe a vê-lo como um alvo a ser atacado. Em alguns casos, a criança chega a acusar o genitor não guardião de abuso sexual, não por maldade, mas porque construiu falsas memórias de que o abuso ocorreu realmente. Para a autora, quando ocorre a SAP, o vínculo da criança com o “genitor alvo” fica prejudicado, tornando-se impossível a convivência, já que ele é visto como o “mau”. E com o genitor guardião, a criança cria um vínculo de dependência doentio, onde não consegue ter suas próprias idéias e opiniões, pensa como esse. Isso gera sentimentos de ambivalência, destruindo o vínculo entre ambos (Dias, 2007; Fonseca, 2006; Trindade, 2010; Silva, 2009, Simão, 2007). Esse vínculo pode não ser mais reconstituído, o que causa danos irreparáveis na estrutura psicológica da criança, que quando adulta, poderá culpar-se por ter alicerçado sua vida e compactuado com uma mentira (Podevyn, 2001). Essas crianças tornam-se órfãos de pais vivos, onde o contato e o vínculo morrem, apesar do genitor estar vivo (Silva, 2009).

Acredita-se que o maior motivo que move o alienador a colocar seu plano em prática seja o inconformismo com a separação, ou até mesmo o desejo de vingança por ter ficado em situação econômica desfavorável (Fonseca, 2006). O fato é que movido por uma vingança egoísta que visa somente os próprios interesses, o alienador acredita que atingirá o ex-cônjuge manipulando a criança, porém, ele não percebe os efeitos desastrosos que vão gradativamente atingindo a criança. A degradação do genitor alienado pode se estender aos demais familiares, como avós, tios, primos, fazendo assim com que a criança passe a acreditar com mais facilidade nas mentiras que lhe estão sendo contadas (Silva, 2009).

A Alienação Parental pode perdurar durante anos, produzindo na criança depressão crônica, incapacidade de adaptação em ambientes fora de sua casa, transtorno de identidade e de imagem, isolamento, comportamento hostil, problemas escolares, sentimentos de impotência, abandono, insegurança, condutas regressivas e falta de organização. Os sentimentos ambivalentes de

amor e ódio com o genitor alienado desnorteiam-a, fazendo com que passe a acreditar nas histórias contadas pelo alienador, comprometendo definitivamente o desenvolvimento normal da criança (Fonseca, 2006; Trindade, 2010).

Com o passar do tempo, as tentativas vão aumentando e a criança passa a contribuir para o afastamento, ela acaba por detestar o outro genitor sem justificativa, por exemplo, podendo inclusive manifestar falsas memórias de abuso sexual. Essas falsas memórias também são introduzidas pelo alienador e se confundem em suas características com o abuso sexual que realmente aconteceu (Trindade, 2010).

A respeito dessa dificuldade de se diferenciar o abuso real do abuso da SAP, Silva (2009) escreve que é necessário que o psicólogo esteja atento, sendo que as características de comportamentos e sintomas são muito parecidas. Entretanto, essa mesma autora aponta que no abuso real a criança não consegue descrever especificamente o que aconteceu, enquanto no abuso imaginário relata riqueza de detalhes. Já quando ocorre o abuso real, os genitores, sentem vergonha de falar sobre o assunto, sabendo assim a dimensão das consequências desse fato, o que não se encontra no alienador (Silva, 2009).

No estágio mais grave da Síndrome é possível a transferência da guarda, onde a criança precisa ir morar com o genitor alienado, com o qual o vínculo está destruído, além de ser afastada do alienador, a pessoa em que a criança está extremamente ligada e com grande dependência. Nesses casos é necessária a intervenção do psicólogo com a criança, a qual terá que residir com um “desconhecido” e também afastar-se da pessoa que construiu um vínculo de dependência doentio. Também será preciso que o profissional acompanhe as visitas ao alienador, minimizando o controle que este poderá estar utilizando mesmo sem residir com a criança (Cruz & Maciel, 2005; Silva, 2009; Trindade, 2010).

Sobre as consequências dos danos psicológicos, Costa (2000) afirma que a causa mais frequente de encaminhamentos de crianças em idade escolar a tratamentos psicológicos é a separação ou a morte dos pais, e que o desempenho escolar de crianças de pais separados é inferior ao das que convivem em lares intactos. A autora ainda complementa que a maior tendência dessas crianças é o isolamento.

Por conta dessas consequências que a separação e a disputa de guarda podem acarretar na vida das crianças, é que a Psicologia deve estar atuando

junto com o Direito nesses processos. É o psicólogo quem pode avaliar como perito ou assistente técnico qual dos genitores tem maiores condições de ficar com a guarda os filhos (Silva, 2009). O melhor guardião é o “guardião psicológico”, aquele que além de companhia constante é capaz de oferecer um lar estável para a criança (Goldstein et. al., 1987). Pereira (2006) complementa afirmando que o melhor interesse da criança deve atender as diretrizes de direitos, deveres e proteção do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Na concepção de Silva (2003), o objetivo básico do serviço de Psicologia no contexto jurídico de casos de disputa de guarda, é o de elaborar um esboço, o mais fidedigno possível, acerca da situação das crianças e suas famílias. Isso auxilia a decisão do juiz em casos de disputa de guarda de filhos, adoção e outros, de modo a que se respeitem as características psicológicas de cada caso, visando principalmente à saúde mental da criança. A autora alerta que nos casos de litígio e disputa de guarda é necessário uma maior atenção do psicólogo para a sua neutralidade, pois há uma tendência ao juízo de valor na hora de emitir pareceres e laudos (Silva, 2003).

Contudo, não é apenas no contexto jurídico que a Psicologia pode auxiliar as famílias, e também não só no momento em que se desfaz o casamento. De acordo com Anton (2000) o terapeuta pode ajudar o casal a avaliar o casamento antes que ele se desfaça, com intuito de que possam considerar se é possível

“salvá-lo” ou não. Esse processo em que o psicólogo auxilia o casal em seus conflitos chama-se mediação, que segundo Müller, Beiras e Cruz (2007), pode ser entendida como um método de solução de conflitos, onde um terceiro, o mediador, com a reabertura do diálogo, contribui para que o casal chegue a uma solução de suas disputas. Esses autores ainda ressaltam que não será o mediador que decidirá ou trará a solução, mas sim o casal que entrará em acordo (Müller, Beiras & Cruz, 2007).

A mediação familiar proporciona uma separação menos traumática para todos os envolvidos, facilitando o entendimento das falhas e necessidades. (Ávila, 2002). Ela é “um instrumento pacificador das relações familiares, fortalecendo a capacidade de diálogo a fim de amenizar ou solucionar os conflitos” (Schabbel, 2005, p.13). Com isso, “o mediador tem a função de ajudar os conflitantes a chegarem voluntariamente a um acordo mutuamente aceitável das questões em disputa” (p. 22).

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